Detroit Industry, North Wall: Art Directors and TRIP/Alamy Stock Photo
Produção de Automóveis, mural de Diego Rivera localizado no Instituto de Artes de Detroit

Capítulo 6 A Firma: proprietários, administradores e empregados

Como as interações entre proprietários, administradores e empregados da firma influenciam os salários, o trabalho e os lucros, e como isso afeta toda a economia

  • As firmas são, ao mesmo tempo, protagonistas em uma economia capitalista e palcos nos quais as interações entre os empregados, administradores e proprietários da empresa se desenrolam.
  • Contratar mão de obra é diferente de comprar outros bens e serviços, e o contrato entre empregador e empregado é incompleto, pois não é capaz de cobrir aquilo que realmente interessa ao empregador: o esforço e a qualidade com que o empregado faz seu trabalho.
  • Contratos incompletos surgem quando informações importantes, como o esforço do empregado, são assimétricas ou não verificáveis.
  • Em economia, a relação estabelecida pelo emprego é representada pelo modelo de um principal (o empregador) interagindo com um agente (o empregado).
  • O modelo principal-agente pode ser utilizado para estudar outras relações regidas por contratos incompletos, tais como a interação entre credor e devedor.
  • As firmas não pagam os menores salários possíveis: para motivar os funcionários a trabalharem com eficiência e a permanecerem na empresa, as firmas estabelecem os salários de tal forma que os empregados possam obter rendas econômicas.
  • O trabalho colaborativo nas firmas traz ganhos mútuos: lucros para os proprietários, e rendas econômicas para administradores e empregados. No entanto, as rendas também levam a desemprego involuntário na economia.

O iPhone e o iPad da Apple são icônicos produtos americanos de alta tecnologia, mas nenhum deles é montado nos Estados Unidos. Até 2011, uma única empresa, a Foxconn, produziu todos os iPhones e iPads em fábricas localizadas na China, principalmente para que a Apple se beneficiasse dos custos mais baixos, inclusive de salários.

A maioria dos componentes do iPhone e do iPad não vêm da China, mas de várias partes do mundo. Itens como a memória flash, o módulo do monitor e a tela sensível ao toque são fabricados por muitas empresas diferentes, inclusive a Toshiba e a Sharp, no Japão. O microprocessador é feito pela Samsung, na Coreia do Sul, e outros componentes, pela Infineon, na Alemanha. Assim como outras firmas, a Apple obtém lucro ao encontrar o fornecedor que lhe ofereça fatores de produção ao menor custo, sejam componentes seja mão de obra, em qualquer lugar do mundo onde esse fornecedor esteja localizado.

O custo de reunir os componentes e montar o produto final na China é pequeno (apenas 4% do custo total) se comparado ao custo das peças fornecidas por economias nas quais os salários são altos, como a Alemanha e o Japão. Quase metade dos funcionários da Apple nos Estados Unidos trabalham vendendo os produtos da empresa ao invés de fabricando-os, enquanto firmas competem em escala global para fechar lucrativos negócios de fornecimento de componentes para a Apple. O custo de produção do iPhone é muito menor do que o preço que a Apple cobra: em 2016, um iPhone 7 de 32 gigabytes custava US$ 224,80 para ser fabricado. Nos Estados Unidos, seu preço de venda era US$ 649.

terceirização
Realocação de parte das atividades de uma empresa para fora das fronteiras nacionais nas quais opera. Pode ocorrer dentro de uma empresa multinacional ou envolver a realocação de seu processo produtivo para outras empresas. Também conhecida como: outsourcing.

A Apple não é a única a terceirizar a produção para países que não são o principal mercado de seus produtos finais. Na maioria dos setores da indústria manufatureira, empresas sediadas em países ricos transferiram parte significativa da produção, antes realizada pelos trabalhadores locais, para países mais pobres onde os salários são mais baixos. Entretanto, a Apple e outras empresas buscam mais do que mão de obra barata. Em alguns dos países fornecedores da Apple, como a Alemanha, os salários são maiores que nos Estados Unidos.

Outras atividades, em especial a de confecção de artigos de vestuário, se realocaram principalmente para economias onde os salários são baixos. Mais de 97% das roupas e de 98% dos calçados vendidos nos Estados Unidos por marcas e varejistas norte-americanos são fabricados no exterior. China, Bangladesh, Camboja, Indonésia e Vietnã estão entre os principais exportadores mundiais de têxteis e artigos do vestuário. Na época da Revolução Industrial, o maior exportador mundial desses produtos era o Reino Unido.

Além disso, nos países em desenvolvimento, os custos de negócio adicionais (como adequação a normas de saúde e segurança) são muito mais baixos, e as regulações ambientais com frequência são menos rigorosas.

firma
Organização econômica na qual agentes privados proprietários de bens de capital contratam e administram trabalhadores para produzir bens e serviços, que serão vendidos no mercado com o objetivo de obter lucro. Também conhecido como: empresa.

Apple, Samsung e Toshiba são organizações empresariais chamadas firmas. Nem todo mundo está empregado em uma firma. Por exemplo, agricultores, carpinteiros, desenvolvedores de softwares ou personal trainers trabalham de forma independente, nem como empregados, nem como empregadores. Enquanto algumas pessoas trabalham para governos e organizações sem fins lucrativos, nas nações ricas, a maioria das pessoas ganha a vida trabalhando em uma firma.

As firmas são atores fundamentais na economia, e vamos utilizar este capítulo e o próximo para explicar como funcionam. Muitas vezes, nos referimos à firma como se fosse uma pessoa: falamos do “preço que a Apple cobra”, por exemplo.

Embora sejam atores na economia — e sejam tratadas como indivíduos em alguns sistemas legais — as firmas também são o palco no qual as pessoas que a compõem (empregados, administradores e proprietários) agem de acordo com seus interesses, às vezes comuns, às vezes conflitantes. No vídeo abaixo, Richard Freeman, economista especializado em mercado de trabalho, explica algumas das consequências da terceirização para esses atores.

Para entender a firma, vamos elaborar modelos de como os empregadores estabelecem os salários e de como os empregados reagem às suas decisões. Já vimos a importância do trabalho e das firmas para a economia nos capítulos anteriores:

  • Trabalho é o meio pelo qual as pessoas produzem seu sustento. Ao decidirem quanto tempo irão trabalhar, as pessoas enfrentam um trade-off entre tempo livre e os bens que podem produzir, ou o salário que podem ganhar.
  • Os níveis de produção, os salários e os padrões de vida cresceram por meio da inovação e adoção de novas tecnologias pelas firmas.
  • Se um processo produtivo exige que o trabalho seja combinado a outros fatores de produção (como o trabalho de Ângela e a terra de Bruno no cultivo de cereal), então, dependendo do poder de negociação dos envolvidos, um contrato voluntário entre os proprietários dos fatores pode especificar como o excedente dessa interação será dividido entre as duas partes.
  • A especialização dos indivíduos nas tarefas em que têm vantagem comparativa gera ganhos potenciais (para todos os envolvidos).
  • A divisão do trabalho pode ser coordenada pelas trocas de mercado. No Capítulo 1, a especialização em cereal ou maçãs foi coordenada pela compra e venda de cereal e maçãs. No Capítulo 5, a interação entre Ângela e Bruno foi coordenada por um contrato cedendo o uso da terra em troca de uma parte da safra de cereais.
  • Entretanto, às vezes as pessoas precisam trabalhar juntas para produzir algo que beneficie a todos, e seu sucesso dependerá de suas preferências e de estratégias para desencorajar o comportamento de carona (free riding).
  • Outra maneira de coordenar e combinar o trabalho a outros fatores de produção é pela organização interna da firma. No Capítulo 2, as firmas produziam tecidos, decidindo internamente quanto carvão comprar e quantos trabalhadores empregar.

Ilustramos cada uma dessas conclusões utilizando modelos que ressaltam alguns aspectos da economia, enquanto deixam outros de lado. No Capítulo 2, não levamos em consideração a forma como se determinava a duração da jornada diária de trabalho enquanto a economia crescia. No Capítulo 3, não elaboramos um modelo de como eram determinados o salário ou a taxa marginal de transformação de tempo livre em bens quando analisamos a decisão de quantas horas trabalhar. No Capítulo 2, contamos uma história de conflito de interesses a respeito dos salários, mas não elaboramos um modelo de interação estratégica e de negociação até os Capítulos 4 e 5. E no Capítulo 5, utilizamos a história de apenas duas pessoas (imaginárias), Bruno e Ângela, para elaborar um modelo de como a negociação pode afetar a eficiência de Pareto e a equidade das alocações.

Neste capítulo, estudaremos como a coordenação do trabalho na economia capitalista moderna ocorre dentro das firmas. Vamos elaborar um modelo de como são determinados os salários quando há conflitos de interesse entre empregadores e empregados, e analisamos o que isso significa para a divisão dos benefícios mútuos resultantes da cooperação em uma firma.

No Capítulo 7, analisaremos a firma como um ator que se relaciona com outras empresas e com seus clientes.

6.1 Firmas, mercados e divisão do trabalho

A economia é composta por pessoas que fazem coisas diferentes: por exemplo, produzindo módulos dos monitores da Apple ou roupas para exportação. Produzir módulos de monitor também envolve muitas tarefas distintas, executadas por diferentes funcionários da Toshiba ou da Sharp, empresas que os fabricam para a Apple.

divisão de trabalho
Especialização dos produtores em diferentes tarefas do processo de produção. Também conhecido como: especialização.

Deixando de lado o trabalho doméstico, a divisão do trabalho em uma economia capitalista é coordenada de duas formas principais: pelas firmas e pelos mercados.

Entre as instituições características das economias capitalistas modernas, a firma rivaliza com o governo em importância. John Micklethwait e Adrian Wooldridge explicam como isso veio a acontecer. John Micklethwait e Adrian Wooldridge. 2003. The Company: A Short History of a Revolutionary Idea. New York, NY: Modern Library.

Por que as firmas funcionam da forma que funcionam? Por exemplo, por que os proprietários da empresa contratam os trabalhadores, e não o contrário? Randall Kroszner e Louis Putterman resumem essa área da economia. Randall S. Kroszner and Louis Putterman (editores). 2009. The Economic Nature of the Firm: A Reader. Cambridge: Cambridge University Press.

  • Nas firmas, os componentes dos bens são produzidos por diferentes pessoas em diferentes departamentos, e são reunidos para produzir uma camisa ou um iPhone, os produtos finais.
  • Ou ainda, os componentes produzidos por grupos de trabalhadores em diferentes firmas podem ser reunidos por interações de mercado entre empresas.
  • Por meio de compras e vendas de mercadorias nos mercados, o iPhone vai do produtor para o bolso do consumidor, assim como a camisa da American Apparel termina no guarda-roupa de alguém.

Portanto, neste capítulo, estudaremos as firmas. Nos capítulos seguintes, estudaremos os mercados. O economista Herbert Simon explicou por que é importante estudar ambos utilizando a visão de um marciano que observa a Terra como exemplo.

Grandes economistas Herbert Simon

Herbert Simon “Imagine um visitante de Marte se aproximando da Terra”, dizia Herbert ”Herb” Simon (1916−2001) a seus leitores. Observando a Terra por meio de um telescópio capaz de revelar estruturas sociais, o que nosso visitante veria? As firmas poderiam se assemelhar a campos verdes, sugeriu ele, e suas divisões e departamentos seriam delimitados por leves contornos em seu interior. Linhas vermelhas, representando compras e vendas, conectariam um campo a outro. Dentro de cada campo, linhas azuis de autoridade conectariam chefe e empregado, supervisor e operário, mentor e aprendiz.

Tradicionalmente, os economistas tiveram como foco o mercado e a determinação de preços sob concorrência. Entretanto, para um visitante de Marte, Simon sugeriu que:

“As organizações seriam a característica dominante da paisagem. Uma mensagem enviada para casa descrevendo a cena falaria de ’grandes áreas verdes interconectadas por linhas vermelhas’. É pouco provável que a mensagem falasse de ’uma rede de linhas vermelhas conectando os pontos verdes’. (Organizations and Markets, 1991)1

Formado como cientista político, o desejo de entender a sociedade levou Simon a estudar tanto instituições quanto a mente humana — para abrir a “caixa preta” de motivações que os economistas assumiam como dadas. Sua contribuição foi reconhecida nas áreas de ciência da computação, de psicologia e, claro, de economia, pela qual recebeu o Prêmio Nobel em 1978.

Uma firma, destacou Simon, não é simplesmente um agente que atua para que oferta e demanda se igualem: é uma organização composta por indivíduos, cujas necessidades e desejos podem entrar em conflito. De que formas essas diferenças poderiam ser resolvidas? Simon se perguntava em que condições um indivíduo passa do trabalho com contrato por prazo determinado (a “venda” de determinada tarefa predefinida) para uma relação de emprego (na qual o chefe determina a tarefa após firmar o contrato com o funcionário, isto é, depois da “venda” do trabalho — essa é a relação essencial nas firmas)?

Quando a tarefa desejada é fácil de ser especificada em um contrato, Simon explicou que poderíamos ver esta relação simplesmente como uma prestação de serviço. Entretanto, a presença de altos níveis de incerteza (por exemplo, se o empregador não sabe de antemão o que precisa ser feito) tornaria impossível especificar o que o trabalhador deve fazer em um contrato. Nesse caso, o resultado seria uma relação empregador-empregado, característica das firmas.2

Seus primeiros trabalhos já exibiam dois dos interesses perenes de Simon: a complexidade das relações econômicas, nas quais um indivíduo pode vender uma obrigação que foi descrita de forma incompleta, e o papel da incerteza em alterar a natureza do processo de decisão. Seu raciocínio demonstrou o surgimento do “chefe”.

Entender como o trabalho com contrato por prazo determinado se transforma em emprego implica que entendemos somente uma relação específica entre dois membros de uma organização: ainda temos de explicar a firma como um todo — os campos verdes que o marciano observa.

O que caracteriza uma boa organização? Essa é uma questão tanto para psicólogos como para economistas, porque sabemos que os incentivos que relacionam recompensas individuais ao sucesso da organização parecem ter efeitos limitados.

A carreira intelectual de Simon pode ser comparada com a de outro grande economista, Friedrich Hayek, cujas ideias vamos analisar detalhadamente no Capítulo 11. Ambos estavam interessados em como as sociedades poderiam prosperar diante da incerteza e de agentes imperfeitos. Para Hayek, o mecanismo de preços era tudo: um dispositivo para coletar e processar grandes quantidades de informação e, então, sincronizar sistemas de tamanhos arbitrários.

Para Simon, no entanto, o mecanismo de preços precisava ser complementado — ou até mesmo suplantado — por instituições e governos mais bem preparados para lidar com a incerteza e com mudanças rápidas. Estes “mecanismos de autoridade” alternativos estão ancorados em aspectos da psiquê humana que foram apenas parcialmente compreendidos pela ciência: lealdade, identificação com o grupo e satisfação criativa.

Até sua morte, em 2001, Simon veria muitas de suas ideias alcançarem o mainstream do pensamento econômico. A economia comportamental tem raízes em suas tentativas de construir teorias econômicas que refletissem os dados empíricos. A visão de Marte concebida por Simon revela que a economia não pode ser uma ciência fechada em si mesma: um economista precisa ser ao mesmo tempo um matemático, trabalhando com conjuntos de decisões e com utilidades, e um psicólogo social, analisando as motivações das relações humanas.

A coordenação do trabalho

A forma como o trabalho é coordenado dentro das firmas é diferente da forma como é coordenado entre os mercados:

  • Firmas representam concentração de poder econômico: centralizado nas mãos dos proprietários e dos administradores, que regularmente emitem diretrizes na expectativa de que seus empregados as cumpram. Na firma, um “pedido” é uma ordem a ser cumprida.
  • Mercados são caracterizados pela descentralização de poder: compras e vendas são resultado de decisões autônomas dos compradores e vendedores. Em um mercado, um “pedido” é uma proposta de compra, que pode ser rejeitada se o vendedor assim o desejar.

Os preços que motivam e restringem as ações das pessoas em um mercado são resultado das ações de milhares ou milhões de indivíduos, e não da decisão de alguém com autoridade. A ideia de propriedade privada especificamente limita as coisas que um governo ou qualquer outra pessoa pode fazer com suas posses.

Por outro lado, em uma firma, seus proprietários ou administradores direcionam as atividades dos empregados, que podem ser milhares ou mesmo milhões. Os gerentes do Walmart, maior rede varejista do mundo, coordenam as atividades de 2,2 milhões de funcionários, um contingente de pessoas maior que qualquer exército da história mundial antes do século XIX. O Walmart é uma empresa excepcionalmente grande, mas não é a única a reunir um grande número de pessoas trabalhando juntas de forma coordenada (pela administração) para obter lucros.

Diferente dos flash mobs, as firmas não se formam espontaneamente e depois desaparecem. Assim como qualquer organização, as firmas têm processos de tomada de decisão e formas de impor suas decisões sobre as pessoas que as compõem. Quando dizemos que “a Apple terceirizou sua produção de componentes” ou que “a empresa determinou um preço de 10,75 dólares”, queremos dizer que os processos de tomada de decisão da firma resultaram nessas ações.3

A Figura 6.1 exibe uma ilustração simplificada dos atores de uma firma e de sua estrutura de tomada de decisões.

Os atores da firma e suas estruturas de informação e de tomada de decisão.
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Figura 6.1 Os atores da firma e suas estruturas de informação e de tomada de decisão.

Os proprietários escolhem as estratégias de longo prazo
: Os proprietários, por meio de seu conselho de administração (composto pelos diretores da empresa), decidem as estratégias de longo prazo da empresa em relação a como, o quê e onde produzir. Em seguida, orientam o(s) gerente(s) a implementar essas decisões.
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Os proprietários escolhem as estratégias de longo prazo

Os proprietários, por meio de seu conselho de administração (composto pelos diretores da empresa), decidem as estratégias de longo prazo da empresa em relação a como, o quê e onde produzir. Em seguida, orientam o(s) gerente(s) a implementar essas decisões.

Os gerentes designam funcionários para cada tarefa
: Cada gerente designa funcionários para realizar as tarefas necessárias à implementação dessas decisões, e tenta garantir que sejam executadas.
Tela inteira

Os gerentes designam funcionários para cada tarefa

Cada gerente designa funcionários para realizar as tarefas necessárias à implementação dessas decisões, e tenta garantir que sejam executadas.

Fluxos de informação
: As setas verdes representam fluxos de informação. As setas verdes para cima são tracejadas porque, com frequência, os funcionários sabem de coisas que os gerentes não sabem, e os gerentes sabem de coisas que os proprietários não sabem.
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Fluxos de informação

As setas verdes representam fluxos de informação. As setas verdes para cima são tracejadas porque, com frequência, os funcionários sabem de coisas que os gerentes não sabem, e os gerentes sabem de coisas que os proprietários não sabem.

informação assimétrica
Informação relevante para todos os participantes em uma interação econômica, que é conhecida por algumas partes envolvidas, mas não por outras. Veja também: seleção adversa, risco moral.

As setas verdes tracejadas para cima representam um problema de informação assimétrica entre os níveis hierárquicos da empresa (entre proprietários e gerentes, entre gerentes e funcionários). Como nem sempre proprietários ou gerentes sabem o que seus subordinados fazem ou sabem, nem todas as suas ordens ou diretrizes (setas cinza para baixo) são necessariamente cumpridas.

Essa relação entre a empresa e seus funcionários difere da relação da empresa com seus clientes, que estudaremos no próximo capítulo. Uma padaria não pode enviar uma mensagem de texto aos seus clientes intimando-os: “Apareçam às 8 da manhã e comprem dois pães por € 1 cada”. Essa empresa pode instigar seus clientes com uma oferta especial, mas, ao contrário do empregador com seus empregados, não pode exigir que eles apareçam. Quando você compra ou vende algo, geralmente o faz por vontade própria. Ao comprar ou vender, você responde a preços, não a ordens.

A firma é diferente: ela se define por uma estrutura de tomada de decisão em que algumas pessoas têm poder sobre outras. Ronald Coase, o economista que deu início ao estudo da firma como ator e palco de relações econômicas, escreveu:

Se um trabalhador muda do departamento Y para o departamento X, não o faz por causa de uma mudança nos preços relativos, mas porque foi ordenado a fazê-lo… o traço que distingue a firma é a supressão do mecanismo de preços. (The Nature of the Firm, 1937)4

Coase destacou que, em uma economia capitalista, a firma é uma economia de planejamento central e de propriedade privada em miniatura. Sua estrutura vertical de tomada de decisão se assemelha à da produção centralmente dirigida nas economias planificadas de diversos países socialistas (e, durante a Segunda Guerra Mundial, nos Estados Unidos e no Reino Unido).5

Contratos e relações

contrato
Documento legal ou entendimento que especifica um conjunto de ações que as partes do contrato devem empreender.

A diferença entre as interações de mercado e as relações dentro das firmas se torna clara quando consideramos os diferentes tipos de contratos que formam a base de cada troca.

O contrato de venda de um automóvel transfere sua propriedade, o que significa que agora o novo proprietário pode utilizar o veículo e excluir outros indivíduos de seu uso. O contrato de locação de um apartamento não transfere sua propriedade (o que incluiria o direito de vendê-lo); ao invés disso, concede um conjunto limitado de direitos sobre o apartamento ao inquilino, inclusive o direito a excluir outros de seu uso (inclusive o locador do imóvel).

trabalho assalariado
Sistema no qual os produtores são pagos pelo tempo que trabalham para os seus empregadores.

Sob um contrato de trabalho assalariado, o empregado dá ao empregador o direito de lhe ordenar que esteja presente em horários específicos, e aceita a autoridade do empregador sobre o uso do seu tempo durante a jornada de trabalho.

O empregador não se torna proprietário do empregado em virtude deste contrato. Se se tornasse, o empregado estaria sendo escravizado. Podemos dizer que o empregador “alugou” o empregado durante uma parte do dia. Em resumo:

  • Contratos de venda de produtos no mercado transferem definitivamente a propriedade do bem do vendedor para o comprador.
  • Contratos de trabalho transferem temporariamente a autoridade sobre as atividades de uma pessoa, o empregado, para o administrador ou proprietário.

As firmas também se diferenciam dos mercados de uma outra forma: as interações sociais desenvolvidas nas firmas às vezes se estendem por décadas, ou mesmo por toda a vida. Nos mercados, compramos de diversos vendedores, então nossas interações geralmente são rápidas e não se repetem. Uma das razões para esta diferença é que trabalhar numa firma − como gerente ou funcionário − significa adquirir uma rede de colaboradores que são essenciais para fazer um bom trabalho. Alguns dos nossos colegas de trabalho se tornarão nossos amigos. Além disso, gerentes e funcionários também adquirem habilidades técnicas e sociais específicas da empresa em que trabalham.

ativo específico da firma
Algo que uma pessoa possui ou pode fazer cujo valor é maior na empresa em que a pessoa se encontra do que na sua melhor alternativa subsequente.

O economista Oliver Williamson denominou essas habilidades, redes de contatos e amizades de ativos específicos do relacionamento ou ativos específicos da firma, porque só são valiosos enquanto o empregado permanecer na empresa em questão. Quando essa relação terminar, o valor destes ativos se perde para ambas as partes. Pense em como isso é diferente das interações sociais que se dão no mercado: ainda que você conheça o rosto ou até mesmo o nome da pessoa de quem compra ou a quem vende algo, geralmente esta relação é temporária, de modo que esse conhecimento é pouco valioso.

Este aspecto social ganha importância econômica quando mudanças na economia afetam as interações sociais.

Como comprador, imagine como a sua vida mudaria se a mercearia do seu bairro fechasse amanhã. Você teria que encontrar um novo lugar para fazer suas compras, e poderia levar alguns minutos para descobrir onde estão localizados os diversos itens que você precisa.

Agora imagine o que mudaria se a empresa em que você trabalha fechasse amanhã. Você perderia sua rede de colegas de trabalho, as amizades que fez na empresa, e de repente, suas habilidades sociais e técnicas específicas para trabalhar nesta companhia se tornariam inúteis para você. Talvez você tivesse que se mudar para outra cidade. Seus filhos precisariam mudar de escola, então também perderiam o contato com os amigos.

Sendo assim, as pessoas que compõem a firma — proprietários, administradores e empregados — estão unidas pelo interesse comum no sucesso da empresa, já que todos seriam prejudicados caso ela fracassasse. No entanto, seus interesses estão em conflito em relação a como distribuir os lucros do sucesso da empresa entre si (salários dos empregados, salários dos administradores e lucros dos proprietários), e pode haver discordâncias em relação a outras políticas da empresa, como as condições de trabalho, os benefícios dos administradores, e quem toma as decisões-chave (como, por exemplo, se a Apple deveria montar os iPhones na China ou nos Estados Unidos).

Exercício 6.1 A estrutura de uma organização

Na Figura 6.1, representamos os atores e a estrutura de tomada de decisão de uma firma típica.

  1. Como os atores e a estrutura de tomada de decisão de três organizações — Google, Wikipédia e uma fazenda familiar — podem ser comparados ao desta firma típica?
  2. Desenhe um diagrama de estrutura organizacional ao estilo da Figura 6.1 para representar cada uma dessas organizações.

Questão 6.1 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

Qual(is) das seguintes afirmações está(ão) correta(s)?

  • Um contrato de trabalho transfere a propriedade do empregado para o empregador.
  • O escritório em que o empregado trabalha é um ativo específico do relacionamento, porque o empregado não pode utilizá-lo após sair da empresa.
  • Em um contrato de trabalho, uma das partes contratantes tem o poder de dar ordens à outra parte, mas esse poder não existe em um contrato de venda.
  • Uma firma é uma estrutura que envolve a descentralização do poder entre os empregados.
  • Isso seria escravidão. Um contrato de trabalho outorga à empresa a autoridade para direcionar as atividades do empregado em horários específicos.
  • O escritório não é um ativo específico do relacionamento, porque depois que a relação de trabalho termina, outro empregado pode utilizá-lo, de modo que o escritório ainda tem valor para a empresa.
  • Um contrato de trabalho confere ao empregador a autoridade de direcionar as atividades do empregado, enquanto um contrato de venda transfere direitos de propriedade, e não vincula as partes a outras ações.
  • Firmas representam concentração de poder econômico nas mãos dos proprietários e dos administradores.

6.2 O dinheiro dos outros: separação entre propriedade e controle

Os lucros da firma legalmente pertencem às pessoas que são proprietárias dos ativos da empresa, que incluem os bens de capital. Os proprietários direcionam os outros membros da firma a praticarem ações que contribuam para os lucros da empresa, o que, por sua vez, aumentará o valor dos ativos da firma e a riqueza dos proprietários.

requerente residual
Pessoa que recebe a renda remanescente de uma empresa ou outro projeto após o pagamento de todos os custos contratuais (por exemplo, do custo de contratar trabalhadores e pagar impostos).

Os proprietários auferem o que resta após as receitas (provenientes da venda dos produtos) serem utilizadas para pagar empregados, administradores, fornecedores, credores e impostos. O lucro é o resíduo: é o que resta das receitas após esses pagamentos. Os proprietários o requerem, e por isso são chamados de requerentes residuais. Os administradores (a menos que também sejam proprietários) não são requerentes residuais, tampouco os empregados.

Esta divisão de receita tem uma implicação importante. Se as receitas da firma aumentarem porque administradores ou empregados fizeram um bom trabalho, os proprietários irão se beneficiar, mas os administradores e os empregados não (a menos que recebam promoções, bônus ou aumentos salariais). Essa é uma das razões pelas quais consideramos a firma como um palco, no qual nem todos os atores têm os mesmos interesses.

Nas pequenas empresas, os proprietários geralmente são também os gerentes, então são responsáveis pelas decisões operacionais e estratégicas. Como exemplo, considere um restaurante de propriedade de um único empresário, que determina o cardápio, as horas de funcionamento, as estratégias de marketing, a escolha dos fornecedores, a quantidade de funcionários e seu salário. Na maioria dos casos, o proprietário tentará maximizar os lucros da empresa ao proporcionar os pratos e o ambiente que as pessoas desejam a preços competitivos. Ao contrário da Apple, o proprietário não pode terceirizar a lavagem de louça ou o serviço dos garçons para onde houver salários baixos.

ação
Parte dos ativos de uma firma que pode ser comprada e vendida. Uma ação dá a seu titular o direito de receber parte do lucro da firma, e de se beneficiar quando o valor dos ativos da empresa aumenta. Também conhecida como: ação ordinária.

Nas grandes corporações, geralmente há muitos proprietários. A maioria deles não faz parte da administração da empresa. Os proprietários da firma são indivíduos e instituições, como os fundos de pensão, que têm ações emitidas pela empresa. Ao emitir ações para o público geral, a firma pode levantar capital para financiar seu crescimento, deixando as decisões estratégicas e operacionais para um grupo relativamente pequeno de administradores especializados.

Essas decisões incluem o que, onde e como fabricar os produtos da firma, ou quanto pagar aos empregados e administradores. A alta direção de uma empresa também é responsável por decidir quanto dos seus lucros será distribuído aos acionistas como dividendo, e quanto será retido para financiar seu crescimento. Naturalmente, os proprietários se beneficiam do crescimento da firma porque são detentores de parte do seu valor, que aumenta à medida que a empresa cresce.

separação entre propriedade e controle
Característica de algumas firmas, nas quais os administradores são um grupo distinto dos proprietários.

Quando os administradores tomam decisões a respeito do uso dos recursos de outras pessoas, ocorre a chamada separação entre propriedade e controle.

A separação entre propriedade e controle resulta em um potencial conflito de interesses.

As decisões dos administradores afetam os lucros, e os lucros determinam os rendimentos dos proprietários. Porém, maximizar os lucros nem sempre é do interesse dos administradores. Eles podem adotar medidas que beneficiam a si próprios às custas dos proprietários: talvez gastem o máximo possível no cartão de crédito da empresa ou procurem aumentar seu próprio poder e prestígio expandindo sua influência, mesmo que isso vá contra os interesses dos acionistas.

Mesmo que a empresa tenha um único proprietário, ele não é obrigado a maximizar seus lucros. Donos de restaurantes podem escolher cardápios com base em seu gosto pessoal ou contratar garçons que sejam seus amigos. Entretanto, ao contrário dos administradores, quando suas escolhas levam a perdas nos lucros, o custo sai diretamente do seu bolso.

No século XVIII, Adam Smith observou a tendência dos altos executivos das empresas a servir a seus próprios interesses, e não aos dos acionistas. A respeito dos gerentes das chamadas companhias de capital acionário, Smith disse:

Uma vez que os diretores dessas companhias administram mais o dinheiro de outros do que o próprio, não é de se esperar que cuidem dele com a mesma vigilância impaciente com a qual os sócios de uma associação privada em geral cuidam do seu próprio… Negligência e abuso, portanto, sempre prevalecem, em maior ou menor grau, na administração dos negócios de uma companhia. (A Riqueza das Nações, 1776)

carona (free ride)
Obter benefícios das contribuições de outras pessoas para algum projeto cooperativo sem dar sua própria contribuição.

Adam Smith não tinha visto uma empresa moderna, mas compreendia os problemas decorrentes da separação entre propriedade e controle. Existem duas formas dos proprietários incentivarem os administradores a servirem aos seus interesses. Os proprietários podem firmar contratos determinando que a remuneração dos administradores depende da evolução do preço das ações da empresa. Além disso, o conselho de administração da empresa, que representa os acionistas e geralmente tem participação substancial nas suas ações (incluindo, por exemplo, o representante de um fundo de pensão), pode monitorar o desempenho dos gerentes. O conselho tem autoridade para destituir administradores, e os acionistas, por sua vez, têm direito a substituir membros do conselho. Os proprietários de grandes empresas, com muitos acionistas, raramente exercem essa autoridade, em parte porque são um grupo grande e diverso, que não consegue se reunir com facilidade para decidir algo. Em algumas ocasiões, no entanto, este problema do caroneiro (free rider) é superado, e um acionista com grande participação na companhia pode provocar uma revolta de acionistas com o objetivo de trocar ou influenciar a alta diretoria.

Quando elaboramos um modelo da firma como ator, geralmente assumimos que ele maximizará os lucros, o que é uma simplificação, mas é razoável para a maioria dos casos:

  • Os proprietários têm grande interesse na maximização dos lucros: é a base da sua riqueza.
  • Concorrência de mercado penaliza ou elimina as firmas que não geram lucros substanciais para os seus proprietários: vimos esse processo nos Capítulos 1 e 2, como parte da explicação da revolução tecnológica permanente, e isso se aplica a todos os aspectos das decisões das empresas.

Questão 6.2 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

Qual(is) das seguintes afirmações sobre a separação entre propriedade e controle está(ão) correta(s)?

  • Quando a propriedade e o controle de uma empresa estão separados, os administradores se tornam os requerentes residuais.
  • Os administradores sempre trabalham para maximizar o lucro da firma.
  • Uma forma de resolver o problema associado à separação entre propriedade e controle é pagar aos administradores um salário que dependa da evolução do preço das ações da firma.
  • Para os acionistas, é prático monitorar o desempenho da administração de uma empresa cujo número de acionistas é grande.
  • Os acionistas são os requerentes residuais.
  • Os administradores podem escolher agir em benefício próprio, às custas dos proprietários.
  • Remuneração vinculada ao desempenho é um método comum de incentivar os administradores a maximizar o valor de sua empresa.
  • Quando existem muitos acionistas, não há somente um problema de coordenação, mas também um problema do caroneiro (free rider): cada acionista depende dos outros para fazer o custoso monitoramento (e como resultado, não ocorre monitoramento algum).

6.3 O trabalho das outras pessoas

Como disse Adam Smith, a firma não apenas administra “o dinheiro dos outros”. Aqueles que tomam decisões em uma firma também decidem a respeito do uso do trabalho das outras pessoas: o esforço de seus empregados. As pessoas fazem parte das firmas porque podem obter melhores resultados se as integrarem do que se não as integrarem. Como ocorre em todas as interações econômicas voluntárias, existem ganhos mútuos. Contudo, assim como surgem conflitos entre proprietários e administradores, geralmente haverá diferenças entre esses e os empregados a respeito de como a empresa irá utilizar a força, a criatividade e outras habilidades dos seus trabalhadores.

Os lucros de uma firma (antes do pagamento de impostos) dependem de três coisas:

  • Os custos de adquirir os fatores de produção necessários para o processo produtivo.
  • O volume de produção (o quanto esses fatores podem produzir).
  • As receitas auferidas ao vender bens ou serviços.

Nosso foco agora é como as firmas buscam minimizar o custo de adquirir a mão de obra necessária para produzir os bens e serviços que vendem. No Capítulo 2, vimos como as empresas podem aumentar a produção sem aumentar seus custos ao adotarem novas tecnologias e, no Capítulo 7, estudaremos as decisões de venda feitas pelas firmas.

Contratar empregados é diferente de comprar outros bens e serviços. Quando compramos uma camisa ou pagamos a alguém para cortar a grama, fica claro o que recebemos em troca do nosso dinheiro. Se não o recebermos, não pagamos, mas se já tivermos pagado, podemos recorrer a um tribunal e recuperar nosso dinheiro.

Uma firma, no entanto, não pode elaborar um contrato de trabalho exigível especificando exatamente as tarefas que seus empregados têm de realizar para serem pagos. Isso ocorre por três razões:

  • Quando elabora o contrato de emprego de um trabalhador, a firma não tem como saber exatamente o que vai precisar que o empregado faça, pois isso será determinado por eventos futuros imprevistos.
  • Seria impraticável ou muito custoso para a empresa monitorar exatamente quanto esforço cada empregado faz em seu trabalho.
  • Mesmo que a firma obtivesse essas informações de alguma forma, elas não poderiam ser a base de um contrato exigível.

Para entender esse último ponto, considere a proprietária de um restaurante que gostaria que sua equipe fosse agradável ao atender os clientes. Imagine como seria difícil para um tribunal decidir se a proprietária pode deixar de pagar um garçom porque ele não sorriu o suficiente.

contrato incompleto
Contrato que não especifica, de forma exigível, cada aspecto da troca que afeta os interesses das partes envolvidas (ou de outros).

Um contrato de trabalho omite coisas importantes tanto para os empregados como para o proprietário da firma: quanto tempo e quão bem o empregado vai trabalhar, e por quanto tempo vai permanecer na empresa. Como resultado desta incompletude contratual, pagar o menor salário possível quase nunca é a estratégia que a firma escolhe para minimizar o custo de obter o esforço necessário por parte do empregado.

Exercício 6.2 Contratos incompletos

Pense em dois ou três empregos com os quais você está familiarizado: talvez professor, comerciante, enfermeiro ou policial.

Em cada caso, indique a razão pela qual o contrato de trabalho é necessariamente incompleto. Quais partes importantes do trabalho da pessoa − coisas que o empregador gostaria de ver o empregado fazer ou não fazer − podem ou não podem ser cobertas por um contrato ou, se forem, não se pode garantir que sejam cumpridas?

Grandes economistas Karl Marx

Photograph of Karl Marx by John Mayall, public domain, via Wikimedia Commons Adam Smith, que escreveu durante o nascimento do capitalismo, no século XVIII, se tornou seu mais famoso defensor. Karl Marx (1818–1883), que assistiu ao amadurecimento do capitalismo nas cidades industriais da Inglaterra, se tornou seu mais famoso crítico.

Nascido na Prússia (hoje parte da Alemanha), Marx foi aluno do curso secundário local, celebrado por seu caráter liberal e iluminista. Em 1842, tornou-se escritor e editor do Rheinische Zeitung, um jornal liberal que foi fechado pelo governo, e depois se mudou para Paris, onde conheceu Friedrich Engels, com quem colaborou para escrever o Manifesto Comunista (1848). Marx então se mudou para Londres, em 1849. No início, ele e sua esposa, Jenny, viveram na pobreza. Marx ganhou dinheiro escrevendo para o New York Tribune sobre os acontecimentos políticos na Europa.

Marx enxergava o capitalismo como sendo apenas o mais recente em uma sucessão de arranjos econômicos em que as pessoas viveram desde a pré-história. A desigualdade não era exclusividade do capitalismo, observou ele − escravidão, feudalismo e a maioria dos outros sistemas econômicos compartilharam dessa característica − mas o capitalismo também gerava mudanças constantes e crescimento da produção.6

Marx foi o primeiro economista a entender por que a economia capitalista foi a mais dinâmica da história humana. A mudança tecnológica constante surgiu, observou ele, porque os capitalistas só podiam sobreviver introduzindo novos produtos e tecnologias, encontrando formas de reduzir custos, e reinvestindo seus lucros em negócios que cresceriam perpetuamente.

Isto, afirmava Marx, inevitavelmente causou um conflito entre empregadores e trabalhadores. Comprar e vender bens em um mercado aberto é uma transação entre iguais: ninguém está em posição de mandar o outro comprar ou vender. No mercado de trabalho, no qual os proprietários do capital são os compradores e os trabalhadores são os vendedores, a aparência de liberdade e igualdade era, para Marx, uma ilusão.

Os empregadores não compraram o trabalho do empregado porque, como vimos neste capítulo, ele não pode ser comprado. Em vez disso, o salário permitiu que o empregador “alugasse” os trabalhadores e os comandasse dentro da firma. Os trabalhadores não estavam propensos a desobedecê-lo porque poderiam perder seus empregos e se juntar ao “exército de reserva” de desempregados (frase que Marx usou em sua obra de 1867, O Capital). Marx pensava que o poder exercido pelos empregadores sobre os trabalhadores era um defeito intrínseco ao capitalismo.7

O Capital é longo e abrange muitos assuntos, mas você pode usar este arquivo para encontrar as passagens de que precisa.

As perspectivas de Marx também influenciaram a história, a política e a sociologia. Ele achava que a história era decisivamente moldada pelas interações entre escassez, progresso tecnológico e instituições econômicas, e que conflitos políticos surgiam a partir de conflitos a respeito da distribuição de renda e da organização dessas instituições. Marx pensava que o capitalismo, ao organizar a produção e a alocação por meio de mercados anônimos, criava indivíduos atomizados em vez de comunidades integradas.

Nos últimos anos, os economistas retornaram aos temas do trabalho de Marx para ajudar a explicar as crises econômicas. Esses temas incluem a firma como arena de conflito e de exercício de poder (este capítulo), o papel do progresso tecnológico (Capítulos 1 e 2), e os problemas criados pela desigualdade (Capítulo 19).

salário por peça
É um tipo de emprego em que o trabalhador recebe um montante fixo por unidade de produto fabricado.

Por que não é possível que as empresas paguem seus empregados apenas pelo que produzirem? Por exemplo, pagar US$ 2 aos funcionários de uma fábrica de roupas por cada peça que concluírem. Esse método de pagamento, conhecido como salário por peça, dá aos empregados um incentivo para se esforçarem, porque levam mais dinheiro para casa se fizerem mais peças de roupas.

No final do século XIX, o salário de mais de metade dos trabalhadores da indústria manufatureira dos Estados Unidos se baseava no que produziam, mas o salário por peça não é amplamente utilizado nas economias modernas. Na virada do século XXI, menos de 5% dos trabalhadores nas fábricas nos Estados Unidos eram pagos por peça e, fora deste setor, salários por peça são usados com frequência ainda menor.8

Por que a maioria das empresas hoje em dia não utiliza esse método simples para estimular seus funcionários a se esforçarem mais?

  • É muito difícil mensurar a quantidade de produto que um empregado produz nas economias modernas, baseadas em conhecimento e na oferta de serviços (pense em alguém que trabalha em um escritório ou que cuida de idosos em domicílio).
  • Raramente os empregados trabalham sozinhos, então é difícil medir a contribuição individual de cada trabalhador (pense na equipe de uma empresa de marketing trabalhando numa campanha publicitária, ou no pessoal da cozinha de um restaurante).

Se não é prático pagar um salário por peça, então que outro método uma firma poderia empregar para induzir os trabalhadores a se esforçarem mais? Como a firma pode proporcionar um incentivo para o trabalhador fazer um bom trabalho mesmo que ele seja pago por seu tempo e não por sua produção? Assim como os proprietários da firma protegem seus interesses atrelando o pagamento dos administradores ao preço da ação da empresa, o administrador utiliza incentivos para que os empregados trabalhem com eficiência.

Questão 6.3 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

Qual(is) das seguintes afirmativas é(são) razões para os contratos de trabalho serem incompletos?

  • A firma não pode determinar por contrato que um empregado não se demita.
  • A firma não pode especificar cada eventualidade em um contrato.
  • A firma não consegue observar exatamente como um empregado está cumprindo o contrato.
  • O contrato é por tempo indeterminado.
  • Pode ser oneroso para a firma se o empregado se demitir, mas os trabalhadores têm o direito de fazê-lo.
  • Uma vez que a firma não conhece todas as tarefas que exigirá de um empregado, o contrato é necessariamente incompleto.
  • Uma vez que o esforço ou a qualidade do trabalho de um indivíduo não podem ser perfeitamente controlados e medidos, não podem ser especificados no contrato.
  • Os contratos de trabalho geralmente são de longo prazo. Um contrato é incompleto não por seu tempo ser indeterminado, mas por não especificar completamente todos os aspectos relevantes da relação.

6.4 Renda econômica do emprego

São muitas as razões pelas quais as pessoas se esforçam em seu trabalho. Para muitos, fazer um bom trabalho é sua própria recompensa, e agir de outra forma iria contra sua ética profissional. Mesmo para aqueles que não têm motivação intrínseca para trabalhar com afinco, sentimentos de responsabilidade em relação aos outros empregados ou ao empregador podem proporcionar uma forte motivação para trabalhar.

Para alguns empregados, o trabalho árduo é uma forma de responder a um sentimento de gratidão pelo empregador, por lhes proporcionar um emprego com boas condições de trabalho. Em outros casos, as firmas identificam equipes de trabalhadores cuja produção é de fácil mensuração − por exemplo, o percentual de decolagens no horário dos voos de uma companhia aérea − e pagam um benefício a todo o grupo, que é dividido entre membros da equipe.

Entretanto, nos bastidores, há outra razão para fazer um bom trabalho: o medo de ser despedido, ou de perder a oportunidade de ser promovido para um cargo com um maior salário e mais estabilidade.

As leis e práticas relativas à quebra do contrato de trabalho por justa causa (ou seja, devido a um trabalho inadequado ou de baixa qualidade, e não a uma demanda insuficiente pelo produto da empresa) diferem de um país para outro. Em alguns países, os proprietários da empresa têm o direito de despedir um trabalhador sempre que desejarem, enquanto, em outros, a demissão é difícil e onerosa. Porém, mesmo nesses casos, um empregado deve temer as consequências de não trabalhar de acordo com os padrões desejados pelo empregador. Um trabalhador que não os cumprisse, por exemplo, dificilmente conseguiria um posto que lhe permitisse continuar empregado quando a diminuição da demanda pelos produtos da empresa levasse à demissão de outros trabalhadores.

Os trabalhadores se preocupam com a possibilidade de perder seus empregos?

renda do emprego
Renda econômica que um trabalhador recebe quando o valor líquido do seu emprego excede o valor líquido de sua melhor alternativa subsequente (isto é, estar desempregado). Também conhecida como: custo de perder o emprego.

Se as firmas pagassem a seus empregados os menores salários que eles estariam dispostos a aceitar, a resposta seria não. Tal salário tornaria o trabalhador indiferente entre permanecer no emprego ou perdê-lo. Contudo, na prática, a maioria dos trabalhadores se preocupa muito com seu emprego. Existe uma diferença entre o valor do emprego (considerando todos os custos e benefícios que acarreta) e o valor da melhor alterativa subsequente − que é estar desempregado e ter de procurar um novo emprego. Em outras palavras, há uma renda do emprego.

As rendas do emprego podem beneficiar os proprietários e os administradores de duas formas:

  • É mais provável que o empregado permaneça na empresa: se deixasse o emprego, a empresa teria de pagar para recrutar e treinar outra pessoa.
  • Podem ameaçar despedir o trabalhador: proprietários e administradores exercem poder sobre os empregados porque esses têm algo a perder. A ameaça pode ser implícita ou explícita, mas fará com que o trabalhador tenha um desempenho que não escolheria sem a ameaça.

Podemos aplicar o mesmo raciocínio ao emprego dos administradores por parte dos proprietários da empresa. A principal razão pela qual os proprietários detêm poder sobre os administradores é poderem demiti-los, e assim eliminar suas rendas do emprego administrativo.

Como os economistas aprendem com os fatos Administradores exercem poder

Estes exemplos mostram o efeito do poder que os gestores e proprietários exercem.

  • Alan Krueger e Alexandre Mas, economistas que estudam o mercado de trabalho, desvendaram o mistério da banda de rodagem dos pneus Bridgestone (Firestone) estar se desprendendo, colocando motoristas em perigo e reduzindo os lucros.9
  • Barbara Ehrenreich trabalhou disfarçada em hotéis simples e restaurantes por um salário mínimo para ver como vivem os pobres dos Estados Unidos.10
  • A jornalista britânica Polly Toynbee já tinha feito o mesmo no Reino Unido em 2003, aceitando empregos como operadora de telemarketing e cuidadora.11
  • Harry Braverman elaborou a história do que chama de processo de “desqualificação”, e sugeriu a possibilidade de que empregos que comprometam as capacidades dos trabalhadores sejam parte de uma estratégia de maximização dos lucros do empregador.12

Quando os economistas concordam Coase e Marx sobre a firma e seus empregados

O escritor George Bernard Shaw (1856–1950) dizia, de modo satírico, que “se todos os economistas fossem colocados lado a lado, não chegariam a uma conclusão”.

Isto é engraçado, mas não é totalmente verdadeiro.

Por exemplo, os dois economistas mais importantes do início do século XIX — Ricardo e Malthus — eram adversários políticos. Ricardo frequentemente esteve ao lado dos empresários, por exemplo, ao apoiar a diminuição dos impostos sobre a importação de cereal para a Grã-Bretanha, com o objetivo de reduzir o preço dos alimentos e possibilitar o pagamento de salários mais baixos. Malthus se opunha a Ricardo e apoiava as Corn Laws, que restringiam a importação de grãos, posição adotada pela nobreza rural. Entretanto, ambos os economistas propuseram a mesma teoria da renda da terra, utilizada até hoje.

Mais impressionante ainda é que dois economistas de diferentes séculos e orientações políticas tenham entendido a firma e seus funcionários de forma semelhante.

No século XIX, Marx contrastou a forma como compradores e vendedores interagem no mercado, participando voluntariamente do comércio, com a organização vertical da firma, na qual os empregadores dão ordens e os trabalhadores as cumprem. Ele chamou os mercados de “um verdadeiro Éden dos direitos inatos do homem”, mas descreveu as firmas como “exploradoras da força de trabalho até o máximo possível”.

Em 2013, quando Ronald Coase faleceu, a revista Forbes o descreveu como “o melhor de todos os grandes economistas da Universidade de Chicago”. O slogan da Forbes é “A ferramenta capitalista”, e a Universidade de Chicago tem a reputação de ser o centro do pensamento econômico conservador.

No entanto, assim como Marx, Coase ressaltou o papel central da autoridade nas relações contratuais da firma:

Observe o caráter do contrato a que um [empregado] se submete ao ser contratado por uma empresa… por certa remuneração, [o empregado] concorda em obedecer às instruções do empresário. (The nature of the firm, 1937)

Lembre-se de que Coase também definiu a firma com base em sua estrutura política: “Se um trabalhador muda do departamento Y para o departamento X, não o faz por causa de uma mudança nos preços relativos, mas porque foi ordenado a fazê-lo.” Coase procurou compreender porque as empresas existem, citando a descrição feita por seu contemporâneo D. H. Robertson, para quem as empresas são como “ilhas de poder consciente neste oceano de cooperação inconsciente”.

Tanto Coase quanto Marx embasaram seu pensamento em observação empírica rigorosa, e chegaram a um entendimento semelhante da hierarquia da firma. Divergiram, porém, em relação às consequências do que observaram: Coase acreditava que a hierarquia da empresa era uma forma de reduzir os custos de fazer negócios. Marx pensava que a autoridade coercitiva do chefe sobre o trabalhador limitava a liberdade desse último. Assim como Malthus e Ricardo, Coase e Marx discordaram. Contudo, tal como Malthus e Ricardo, também contribuíram para o avanço da ciência econômica com uma ideia em comum.

Quantificando o custo de perder o emprego

Lembre-se de que a renda econômica mede o valor de uma situação — por exemplo, estar em seu atual emprego — em comparação ao que você obteria se a situação atual não fosse mais possível.

Para calcular a renda do emprego — ou, em outras palavras, o custo líquido de perder o emprego — temos de ponderar todos os custos e benefícios do trabalho comparados aos de estar desempregado e procurar outro emprego.

Existem alguns custos de trabalhar, tais como:

  • A desutilidade do trabalho: os empregados têm que dedicar tempo a fazer coisas que prefeririam não fazer.
  • O custo de se deslocar até o trabalho todos os dias.

Porém existem muitos benefícios, que se perderiam se você perdesse o emprego:

  • Renda do salário: pode ser parcialmente compensada pelo auxílio-desemprego ou, em países mais pobres, pela possibilidade de trabalho autônomo com salários mais baixos, ou de trabalhar na propriedade agrícola da família.
  • Ativos específicos da firma: inclusive as amizades feitas no trabalho, e talvez a proximidade entre o local de trabalho e sua atual residência.
  • Assistência médica: em alguns países, o empregador paga pelos serviços de saúde dos empregados.
  • Status social de estar empregado: no Capítulo 13, veremos que, para a maioria das pessoas, o estigma de estar desempregado equivale a um custo financeiro substancial.

Mesmo nos restringindo a analisar a perda de salários, o custo é alto. Mas como medimos quão alto ele é?

Como os economistas aprendem com os fatos Qual o tamanho das rendas do emprego?

Deixando de considerar o indubitavelmente grande — mas difícil de medir — custo psicológico e social de perder o emprego, estimar o custo desta perda (o tamanho da renda econômica do emprego) não é simples.

Podemos comparar a situação econômica dos trabalhadores que estão empregados atualmente com a situação econômica dos desempregados? Não, porque os desempregados são um grupo diferente de pessoas, com capacidades e competências diferentes. Mesmo que estivessem empregados, tenderiam (em média) a ganhar menos do que as pessoas empregadas atualmente.

experimento natural
Estudo empírico que explora controles estatísticos que ocorrem naturalmente no qual os pesquisadores não têm a capacidade de alocar participantes para grupos de tratamento e de controle, como no caso dos experimentos convencionais. Ao invés disso, diferenças na lei, política, clima ou outros eventos podem oferecer a oportunidade de analisar as populações como se fossem parte de um experimento. A validade de tais estudos depende da premissa de que a alocação de sujeitos para grupos de controle ou de tratamento que ocorrem naturalmente é aleatória.

O fechamento total de uma empresa ou uma demissão em massa de funcionários proporcionam um experimento natural que pode ajudar a responder essa questão. Poderíamos observar as rendas dos trabalhadores antes e depois de terem perdido o emprego durante um corte de vagas de trabalho. Por exemplo, quando uma fábrica fecha porque a matriz decidiu realocar a produção para alguma outra parte do mundo, praticamente todos os trabalhadores perdem seu emprego, e não apenas os que estavam mais propensos a perdê-los devido a seu mau desempenho.13 14

Louis Jacobson, Robert Lalonde e Daniel Sullivan utilizaram esse experimento natural para estimar o custo da perda de empregos. Eles estudaram trabalhadores com experiência (não recém-contratados) e em período integral que foram atingidos por demissões em massa no estado da Pensilvânia, Estados Unidos, em 1982. Em 1979, esses trabalhadores dispensados tinham renda média de 50.000 dólares (a preços de 2014). Aqueles que tiveram a sorte de encontrar outro emprego em menos de três meses aceitaram empregos que pagavam muito menos: em média, apenas US$ 35.000, o que significa que a demissão levou a uma queda de US$ 15.000 em sua renda.15

Quatro anos depois, eles ainda estavam ganhando US$ 13.300 a menos do que trabalhadores semelhantes que recebiam o mesmo salário inicial, mas em empresas que não demitiram trabalhadores. Nos cinco anos que se seguiram à demissão, eles perderam o equivalente a um ano inteiro de salário.

Muitos deles, é claro, não encontraram trabalho algum, sofrendo custos ainda maiores.

O ano de 1982 não era um bom momento para procurar trabalho na Pensilvânia, mas estimativas semelhantes (por exemplo, do estado de Connecticut, Estados Unidos, entre 1993 e 2004) sugerem que mesmo em tempos melhores, as rendas do emprego são suficientemente grandes para que os trabalhadores se preocupem com a possibilidade de perdê-las.

Questão 6.4 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

Em qual(is) das situações de emprego seguintes a renda do emprego, ceteris paribus, seria alta?

  • Em um emprego que ofereça muitos benefícios, como moradia e atendimento médico.
  • Em um boom econômico, quando a razão entre pessoas procurando emprego e o total de vagas é baixa.
  • Quando o trabalhador recebe um alto salário porque é um contador qualificado e há escassez de contadores habilitados.
  • Quando a trabalhadora recebe um salário alto porque os clientes da empresa a conhecem e confiam nela.
  • Se o empregado perde o emprego, todos esses benefícios se perdem, então a renda econômica deste emprego é alta.
  • O custo de perder o emprego é baixo, porque seria fácil encontrar outro emprego. Portanto, a renda econômica é baixa.
  • Um contador qualificado conseguirá facilmente encontrar outros empregos com um salário semelhante, de modo que a renda econômica deste emprego é baixa.
  • Essa trabalhadora recebe um salário alto por causa de ativos específicos da firma, que se perderiam se ela saísse. Outras firmas lhe pagariam um salário mais baixo (pelo menos inicialmente), de modo que a renda econômica neste emprego é alta.

6.5 Determinantes da renda do emprego

Para construir um modelo de como rendas do emprego podem ser usadas para motivar os funcionários a trabalhar com afinco, consideremos Maria, uma empregada que ganha U$ 12 por hora por uma jornada de trabalho de 35 horas semanais. Para determinar sua renda econômica, precisamos pensar como ela avaliaria dois aspectos de seu emprego:

  • O pagamento que ela recebe: algo que, naturalmente, ela valoriza.
  • O quanto ela se esforça no trabalho: ela não gostaria de trabalhar mais do que o necessário.
utilidade
Indicador numérico do valor que alguém atribui a um resultado, de tal forma que os resultados de maior valor serão escolhidos em detrimento dos de menor valor quando ambos estiverem disponíveis.

Utilizando o conceito de utilidade introduzido no Capítulo 3, podemos dizer que a utilidade de Maria aumenta de acordo com os bens e serviços que ela pode comprar com o seu salário, mas diminui devido à inconveniência de ir trabalhar e de se esforçar o dia todo — a desutilidade do trabalho.

A desutilidade do trabalho para Maria depende de quanto esforço ela dedica a seu trabalho. Suponha que ela gaste metade de seu tempo de trabalho realmente trabalhando, e metade fazendo outras coisas, como dar uma olhada no Facebook. Representamos essa situação por um nível de esforço de 0,5. Trabalhar com esse esforço equivale a um custo de US$ 2 por hora para Maria. Para calcular sua renda do emprego, devemos encontrar primeiro sua utilidade líquida de trabalhar e ganhar US$ 12, comparada à de estar desempregada e não ganhar nada.

Esta é a sua renda do emprego por hora. A renda do emprego total (ou custo de perder o emprego) depende de quanto tempo Maria supõe que permanecerá desempregada. Vamos supor que, se perder o emprego, ela espera ficar desempregada durante 44 semanas antes de encontrar outro. A análise da Figura 6.2 mostra como calcular a renda.

Renda do emprego de Maria para dado esforço e um salário de US$ 12 em uma economia sem auxílio-desemprego.
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Figura 6.2 Renda do emprego de Maria para dado esforço e um salário de US$ 12 em uma economia sem auxílio-desemprego.

Salário de Maria
: O salário de Maria, depois dos impostos e de outras deduções, é de US$ 12 por hora. Olhando para o futuro (tomando o presente como tempo 0), ela continuará recebendo este salário se mantiver seu emprego, indicado pela linha horizontal no topo da figura.
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Salário de Maria

O salário da Maria, depois dos impostos e de outras deduções, é de US$ 12 por hora. Olhando para o futuro (tomando o presente como tempo 0), ela continuará recebendo este salário se mantiver seu emprego, indicado pela linha horizontal no topo da figura.

A desutilidade do trabalho
: O nível atual de esforço de Maria é 0,5: ela desenvolve atividades não laborais durante metade de seu tempo no emprego. Trabalhar com esse nível de esforço equivale a um custo de US$ 2 por hora para Maria.
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A desutilidade do trabalho

O nível atual de esforço de Maria é 0,5: ela desenvolve atividades não laborais durante metade de seu tempo no emprego. Trabalhar com esse nível de esforço equivale a um custo de US$ 2 por hora para Maria.

O benefício líquido do trabalho
: A diferença entre seu salário e a desutilidade do esforço é a renda econômica por hora que Maria recebe enquanto empregada.
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O benefício líquido do trabalho

A diferença entre seu salário e a desutilidade do esforço é a renda econômica por hora que Maria recebe enquanto empregada.

Se Maria perdesse o emprego
: Se, ao invés disso, Maria perdesse o emprego no momento 0, ela deixaria de receber seu salário. Esta situação lamentável persistiria enquanto ela permanecesse desempregada, o que é indicado pela linha horizontal no final do gráfico.
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Se Maria perdesse o emprego

Se, ao invés disso, Maria perdesse o emprego no momento 0, ela deixaria de receber seu salário. Esta situação lamentável persistiria enquanto ela permanecesse desempregada, o que é indicado pela linha horizontal no final do gráfico.

A duração do desemprego
: A duração esperada do desemprego é de 44 semanas, nas quais Maria teria trabalhado 35 horas por semana se estivesse empregada. Esse é o tempo que ela vai ficar sem receber pagamento (e sem a desutilidade de trabalhar).
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A duração do desemprego

A duração esperada do desemprego é de 44 semanas, nas quais Maria teria trabalhado 35 horas por semana se estivesse empregada. Esse é o tempo que ela vai ficar sem receber pagamento (e sem a desutilidade de trabalhar).

Maria encontra um emprego
: Maria espera encontrar outro emprego com o mesmo salário depois de 44 semanas.
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Maria encontra um emprego

Maria espera encontrar outro emprego com o mesmo salário depois de 44 semanas.

Renda do emprego de Maria
: A área sombreada é o custo total de perder o emprego, em que Maria incorre durante o tempo em que está desempregada, ou seja: sua renda do emprego.
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Renda do emprego de Maria

A área sombreada é o custo total de perder o emprego, em que Maria incorre durante o tempo em que está desempregada, ou seja: sua renda do emprego.

Sua renda do emprego total é a renda do emprego por hora vezes o número de horas de trabalho que Maria deixará de trabalhar se perder seu emprego. É a área sombreada na figura.

auxílio-desemprego
Transferência de recursos do governo recebida por uma pessoa desempregada. Também conhecido como: seguro-desemprego.

As pessoas que perdem o emprego geralmente podem esperar receber ajuda da família e dos amigos enquanto estão desempregadas. Além disso, em muitos países, pessoas que perdem o emprego recebem auxílio-desemprego ou assistência financeira do governo. Nas economias mais pobres, essas pessoas podem ganhar uma pequena quantia trabalhando como autônomas em atividades informais.

salário de reserva
O que um empregado receberia em um emprego alternativo, ou como auxílio-desemprego ou algum outro benefício, se ele ou ela não estivesse trabalhando em seu atual emprego.

Se Maria receber auxílio-desemprego ou renda de alguma destas fontes, a perda da renda do salário será parcialmente compensada. Suponhamos que, enquanto permanecer desempregada, Maria receba um benefício equivalente a um salário de U$ 6 por hora durante uma semana de 35 horas. Esse é seu salário de reserva, o menor salário que a levaria a aceitar um emprego no qual ela não vivencia nenhuma desutilidade de trabalhar.

Na Figura 6.2, mostramos a situação de Maria quando ela trabalha com afinco em um emprego, e a desutilidade de seu esforço é de $ 2 por hora durante o horário de trabalho. Não há auxílio-desemprego, então seu salário de reserva é zero. Com um salário de $ 12, sua renda do emprego é $ 10 por hora: é o que Maria perderia se deixasse seu emprego e ficasse desempregada.

Na Figura 6.3, incluímos o auxílio-desemprego de $ 6. Trabalhando tão dedicadamente como antes e sujeitando-se a $ 2 por hora de desutilidade do esforço, sua renda do emprego agora é dada pelo salário de $ 12 menos a desutilidade do esforço ($ 2) menos o salário de reserva ($ 6): ou seja, é uma renda de $ 4 por hora. Maria agora perderia $ 4 por hora se deixasse seu emprego e ficasse desempregada.

Renda do emprego de Maria para dado esforço e um salário de US$ 12, em uma economia com um auxílio-desemprego de US$ 6 de duração ilimitada.
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Figura 6.3 Renda do emprego de Maria para dado esforço e um salário de US$ 12, em uma economia com um auxílio-desemprego de US$ 6 de duração ilimitada.

Nosso cálculo da renda de emprego deve considerar o salário de reserva:

E considerando a duração do desemprego, observamos que:

Em algum momento as assistências aos desempregados acabam: as famílias e os amigos não poderão ajudar para sempre, e o auxílio-desemprego do governo frequentemente tem prazo limitado. Se a elegibilidade de Maria ao auxílio-desemprego de US$ 6 durasse apenas 13 semanas, seu salário de reserva não seria US$ 6 — ela não seria indiferente entre um emprego que pagasse US$ 6 por hora e o desemprego. A renda do emprego seria maior e seu salário de reserva seria menor, porque o nível médio dos benefícios que ela esperaria receber durante as 44 semanas de desemprego seria muito menor que US$ 6.

Exercício 6.3 Pressupostos do modelo

Como em todos os modelos econômicos, nossa representação simplificada da renda do emprego de Maria deliberadamente omitiu alguns aspectos do problema que podem ser importantes. Por exemplo, assumimos que:

  • Maria encontra um emprego com o mesmo salário depois do seu período de desemprego.
  • Ela não enfrenta quaisquer custos psicológicos ou sociais de estar desempregada.

Redesenhe a Figura 6.2 para mostrar que relaxar cada uma destas suposições alteraria a renda do emprego. Especificamente, assuma que:

  • Maria só consegue encontrar um emprego com um salário menor, de US$ 6 por hora, depois do seu período de desemprego.
  • Ela enfrenta um custo psicológico de US$ 1 por hora por estar desempregada. Quando desempregada, ela ganha US$ 2 por hora porque não há mais a desutilidade de trabalhar, então o ganho líquido é de US$ 1.

Nosso próximo passo é estudar a interação social entre o empregador (que define o salário sabendo que este afeta a renda do emprego de Maria) e a própria Maria, cuja decisão de quanto se esforçar em seu trabalho é influenciada pela renda.

Questão 6.5 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

Em seu emprego atual, Maria ganha US$ 12 por hora e trabalha 35 horas semanais. A desutilidade de seu esforço equivale a um custo de US$ 2 por hora de trabalho. Se ela perder o emprego, receberá um auxílio-desemprego equivalente a US$ 6 por hora. Além disso, estar desempregada tem custos psicológicos e sociais equivalentes a US$ 1 por hora. Portanto:

  • A renda de emprego por hora é de US$ 3.
  • O salário de reserva de Maria é de US$ 6 por hora.
  • Se, depois de 44 semanas desempregada, Maria conseguir outro emprego com o mesmo salário, sua renda do emprego será US$ 6.160.
  • Se, depois de 44 semanas desempregada, Maria só conseguir um emprego com um salário mais baixo, sua renda do emprego será de mais de US$ 7.700.
  • Renda do emprego por hora = salário – seguro-desemprego – desutilidade de esforço + desutilidade de desemprego = 12 – 6 – 2 + 1 = US$ 5. Este é o benefício líquido por hora de estar empregada comparado a estar desempregada.
  • Salário de reserva de Maria = seguro-desemprego – desutilidade de desemprego = 6 – 1 = US$ 5. Este é o salário pelo qual Maria está minimamente disposta a renunciar ao auxílio-desemprego e voltar a trabalhar, mas não é suficiente para que ela se esforce!
  • Renda do emprego de Maria = US$ 5 (renda do emprego por hora) × 35 horas por semana × 44 semanas = US$ 7.700.
  • Se Maria conseguisse arranjar um emprego com o mesmo salário depois de 44 semanas, sua renda de emprego seria = US$ 5 (renda por hora) × 35 horas por semana × 44 semanas = US$ 7.700. Se o novo emprego lhe pagar um salário mais baixo, sua renda de emprego seria maior que US $7.700.

6.6 Trabalho e salários: o modelo de esforço de trabalho

Quando o custo de perder o emprego (dado pela renda do emprego) é alto, os trabalhadores estão dispostos a se esforçar mais em seu trabalho para reduzir a probabilidade de perder o emprego. Mantidas constantes outras formas de influenciar a renda do emprego, uma firma pode aumentar o custo de perder o emprego — e, portanto, o esforço exercido por seus empregados — ao aumentar os salários.

Agora vamos representar essa interação social interna às firmas como um jogo entre proprietários (por meio de seus administradores) e empregados.

Lembre-se que um jogo é a descrição de uma interação social, incluindo:

  • a lista de jogadores.
  • as estratégias que podem adotar.
  • a ordem em que os jogadores escolhem suas ações.
  • o que os jogadores sabem quando escolhem suas ações.
  • os resultados de cada jogador (seus payoff) para todas as estratégias que poderiam escolher.

Assim como em outros modelos, ignoramos alguns aspectos da interação para nos concentrarmos no que é importante, seguindo o princípio de que às vezes enxergamos mais olhando menos.

No palco da firma, o elenco consiste em apenas dois personagens, o proprietário (o empregador) e um único trabalhador, Maria. O jogo é sequencial (um dos dois escolhe primeiro, como no jogo do ultimato que vimos na Seção 10 do Capítulo 4), e é repetido em cada período de emprego. Aqui está a ordem de jogo:

  1. O empregador determina o salário: com base em seu conhecimento de como empregados como Maria reagem a salários mais altos ou mais baixos, e informa a ela que estará empregada pelo mesmo salário nos próximos períodos, desde que dedique suficiente esforço a seu trabalho.
  2. Maria escolhe um nível de esforço de trabalho: esse nível é uma resposta ao salário oferecido, levando em consideração os custos de perder o emprego se ela não se esforçar o suficiente.

O payoff do empregador é o lucro. Quanto maior o esforço de Maria, mais bens ou serviços ela produzirá, e mais lucro ele terá. O payoff de Maria é o valor líquido do salário que ela recebe, levando em consideração o esforço que ela dedicou.

equilíbrio de Nash
Conjunto de estratégias, uma para cada jogador, em que a estratégia de cada jogador deve ser a melhor resposta às estratégias escolhidas por todos os outros.

Se a escolha de Maria quanto ao seu nível de esforço de trabalho é sua melhor resposta à oferta do empregador, e o empregador escolhe o salário que maximiza seu lucro dado que Maria responde da melhor forma que puder, essas estratégias formam um equilíbrio de Nash.

Os empregadores geralmente contratam supervisores de trabalho e podem instalar equipamentos de vigilância para monitorar seus empregados, aumentando a probabilidade de que a direção descubra se um trabalhador não está se esforçando ou não faz um bom trabalho. Vamos ignorar estes custos adicionais e supor apenas que o empregador às vezes obtenha algumas informações sobre o esforço e a qualidade do trabalho de um empregado. Isto não é suficiente para implementar um contrato de salário por peça, mas é mais do que suficiente para demitir um trabalhador se as informações não forem boas. Maria sabe que a chance do empregador receber más notícias sobre seu desempenho diminui à medida que seu esforço no trabalho aumenta.

Para escolher o salário que vai estabelecer, o empregador precisa saber como o trabalhador, em termos de esforço no trabalho, responderá a salários mais altos. Por isso, vamos analisar a decisão de Maria primeiro.

A melhor resposta do empregado

O esforço de Maria pode variar entre zero e um. Podemos interpretá-lo como a proporção de cada hora de trabalho em que Maria se esforça diligentemente (no restante do tempo, ela não está trabalhando). Um nível de esforço de 0,5 indica que Maria está gastando metade do dia de trabalho em atividades não relacionadas ao trabalho, como entrar no Facebook, fazer compras online ou simplesmente olhar pela janela.

Vamos assumir que o salário de reserva de Maria é US$ 6. Mesmo que ela não trabalhasse (e por isso não tivesse nenhuma desutilidade de esforço, passando o dia todo no Facebook e sonhando acordada), o emprego com salário de US$ 6 não seria melhor do que ficar desempregada. Sendo assim, de um modo ou de outro, ela não se importaria se perdesse o emprego. Sua melhor resposta para um salário de US$ 6 seria não fazer esforço algum.

E se lhe pagassem um salário mais alto?

Para Maria, o esforço tem um custo — a desutilidade do trabalho — e um benefício: aumenta a probabilidade dela manter seu emprego e a renda do emprego. Ao escolher seu nível de esforço, ela precisa encontrar um equilíbrio entre custo e benefício.

Um salário mais alto aumenta a renda do emprego e, portanto, o benefício do esforço, levando-a a escolher um nível mais alto de esforço. A melhor resposta de Maria (o esforço que ela escolhe fazer) aumentará com o nível do salário escolhido pelo empregador.

função de melhor resposta do trabalhador (ao salário)
Quantidade ótima de trabalho que um trabalhador escolhe realizar para cada salário que o empregador lhe oferece.

A Figura 6.4 mostra o esforço que Maria escolhe fazer a cada nível de salário, formando sua curva de melhor resposta ou função de melhor resposta. (Assim como as funções de produção do Capítulo 3, esta curva mostra como uma variável, neste caso o esforço, depende da outra, o salário).

Melhor resposta de Maria ao salário. O ponto J se refere à informação da Figura 6.3 (salário = $ 12, esforço = 0,5 e, caso ocorra, duração esperada do desemprego = 44 semanas).
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Figura 6.4 Melhor resposta de Maria ao salário. O ponto J se refere à informação da Figura 6.3 (salário = $ 12, esforço = 0,5 e, caso ocorra, duração esperada do desemprego = 44 semanas).

Esforço por hora
: O esforço por hora, medido no eixo vertical, varia entre zero e um.
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Esforço por hora

O esforço por hora, medido no eixo vertical, varia entre zero e um.

A relação entre esforço e salário
: Se lhe pagam $ 6, Maria não se importa em perder o emprego, porque US$ 6 é o seu salário de reserva. É por isso que ela não faz esforço algum com um salário de US$ 6. Se lhe pagarem um salário maior, ela fará mais esforço.
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A relação entre esforço e salário

Se lhe pagam $ 6, Maria não se importa em perder o emprego, porque $ 6 é o seu salário de reserva. É por isso que ela não faz esforço algum com um salário de US$ 6. Se lhe pagarem um salário maior, ela fará mais esforço.

Melhor resposta do trabalhador
: A curva inclinada para cima mostra quanto esforço Maria faz a valor de salário-hora no eixo horizontal.
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Melhor resposta do trabalhador

A curva inclinada para cima mostra quanto esforço Maria faz a cada valor de salário-hora no eixo horizontal.

O efeito de um aumento salarial quando o esforço é baixo
: Quando o salário é baixo, a inclinação da curva de melhor resposta é maior: um pequeno aumento no salário leva a um aumento substancial do esforço.
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O efeito de um aumento salarial quando o esforço é baixo

Quando o salário é baixo, a inclinação da curva de melhor resposta é maior: um pequeno aumento no salário leva a um aumento substancial do esforço.

Rendimentos marginais decrescentes
: No entanto, aos níveis de salário mais altos, aumentos salariais têm um menor efeito menor sobre o esforço.
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Rendimentos marginais decrescentes

No entanto, aos níveis de salário mais altos, aumentos salariais têm um menor efeito sobre o esforço.

O conjunto de possibilidades do empregador
: A curva de melhor resposta é a fronteira de possibilidades de salário e esforço que o empregador obtém de seus empregados.
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O conjunto de possibilidades do empregador

A curva de melhor resposta é a fronteira do conjunto de possibilidades de salário e esforço que o empregador obtém de seus empregados.

A TMT do empregador
: A inclinação da curva de melhor resposta do empregador é a taxa marginal de transformação (MRT) de salários mais altos em mais esforço por parte do trabalhador.
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A TMT do empregador

A inclinação da curva de melhor resposta do empregador é a taxa marginal de transformação (TMT) de salários mais altos em mais esforço por parte do trabalhador.

O ponto J da Figura 6.4 representa a situação ilustrada na Figura 6.3, discutida no final da seção anterior. O salário de reserva de Maria é US$ 6; ela recebe US$ 12 em seu emprego e escolhe fazer um esforço de 0,5.

A curva de melhor resposta é côncava, e se torna mais plana à medida que o salário e o nível de esforço aumentam. Isso ocorre porque, à medida que o nível de esforço se aproxima do máximo possível, a desutilidade do esforço se torna maior. Neste caso, é necessária uma renda de emprego maior — e, portanto, um salário maior — para fazer com que o empregado se esforce mais.

Do ponto de vista do proprietário ou do empregador, a curva de melhor resposta mostra como pagar salários mais altos pode levar a mais esforço, mas com rendimentos marginais decrescentes. Em outras palavras, quanto maior for o salário inicial, menor será o incremento no esforço e na produção que o empregador receberá para cada US$ 1 por hora adicional de salário.

A curva de melhor resposta é a fronteira do conjunto de possibilidades de salário e esforço que a empresa pode obter de seus funcionários, e a inclinação da fronteira é a taxa marginal de transformação de salário em esforço.

O salário mais baixo que a firma poderia estabelecer para Maria seria o salário de reserva, $ 6, ao qual a curva de melhor resposta chega ao eixo horizontal e o esforço é zero. Portanto, podemos observar que a empresa nunca ofereceria o menor salário possível, porque Maria não trabalharia neste caso.

Leibniz: A função de melhor resposta do trabalhador

Na Figura 6.4, desenhamos a função de melhor resposta sob o pressuposto de que a duração estimada do desemprego é de 44 semanas. Se a duração esperada mudasse, a função de melhor resposta também seria alterada. Se as condições econômicas piorassem, aumentando a duração do desemprego, a renda do emprego de Maria seria maior. Logo, para qualquer salário, sua melhor resposta seria exercer um maior nível de esforço.

Questão 6.6 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

A Figura 6.4 exibe a curva de melhor resposta de Maria quando a duração estimada do desemprego era de 44 semanas. Qual(is) das seguintes afirmações está(ão) correta(s)?

  • Se a duração estimada do desemprego aumentasse para 50 semanas, a melhor resposta de Maria a um salário de $ 12 seria um nível de esforço acima de 0,5.
  • Se o seguro-desemprego fosse reduzido, o salário de reserva de Maria seria superior a $ 6.
  • Para o intervalo de salários exibido na figura, Maria nunca faria o máximo esforço possível por hora.
  • Aumentar o esforço de 0,5 para 0,6 exige um aumento de salário maior do que aumentar o esforço de 0,8 para 0,9.
  • 0,5 é a melhor resposta de Maria a um salário de $ 12 quando a duração estimada do desemprego é de 44 semanas. Se a duração aumentar para 50 semanas, o custo de perder o emprego aumenta, então Maria trabalharia mais arduamente pelo mesmo salário.
  • Se o auxílio-desemprego fosse reduzido, o salário de reserva de Maria cairia abaixo de $ 6.
  • O nível máximo de esforço não seria alcançado ao longo da faixa salarial apresentada.
  • Quando o esforço é menor, é necessário um menor incremento salarial para aumentá-lo em 0,1.

6.7 Salários, esforço e lucros no modelo de esforço de trabalho

Maria não está na situação que Ângela enfrentou quando Bruno a obrigou a trabalhar sob a mira de uma arma. Maria tem poder de negociação porque tem sempre a possibilidade de ir embora, opção que Ângela não tinha inicialmente.

Maria escolhe quanto se esforça em seu trabalho. O melhor que o proprietário pode fazer é determinar as condições em que ela faz essa escolha. Os proprietários e administradores sabem que não podem fazer com que Maria se esforce mais do que determina a curva de melhor resposta mostrada na Figura 6.4. O fato de a curva de melhor resposta ser inclinada para cima significa que os empregadores enfrentam um trade-off: só podem obter mais esforço se pagarem salários mais altos.

Como vimos no Capítulo 2, para maximizarem os lucros, as firmas desejam minimizar os custos de produção. Mais especificamente, desejam pagar o menor preço possível pelos insumos. Uma empresa que compra petróleo para usar no processo produtivo procurará o fornecedor que pode vendê-lo ao menor preço por litro ou, de modo equivalente, ofertar a maior quantidade de petróleo por dólar. Da mesma forma, Maria fornece um fator de produção e seu empregador gostaria de comprá-lo pelo menor preço — mas isso não significa pagar o salário mais baixo possível. Já sabemos que se ele pagasse o salário de reserva, os trabalhadores poderiam até vir trabalhar (eles não se importariam de um jeito ou de outro), mas não trabalhariam mesmo que viessem.

O salário, w, é o custo pago pelo empregador por uma hora do tempo de um trabalhador. Entretanto, o importante para a produção não é quantas horas Maria fornece, mas sim quantas unidades de esforço: o esforço é o fator de produção. Se Maria escolhe fornecer 0,5 unidades de esforço por hora e o seu salário por hora é w, o custo para o empregador de uma unidade de esforço é de 2w. Em geral, se ela fornece e unidades de esforço por hora, o custo de uma unidade de esforço é w/e.

Assim, para maximizar os lucros, o empregador deve encontrar uma combinação factível de esforço e salário que minimize o custo por unidade de esforço, w/e.

Outra maneira de dizer a mesma coisa é: o empregador deve maximizar a quantidade de unidades de esforço (às vezes chamadas de unidades de eficiência) que ele aufere por dólar de custo salarial, e/w.

Na Figura 6.5, a reta inclinada para cima reúne um conjunto de pontos que têm a mesma relação de esforço por salário, e/w. Se o salário for de $ 10 por hora, e um trabalhador fornece 0,45 unidades de esforço por hora, o empregador recebe 0,045 unidades de eficiência por dólar. De modo equivalente, uma unidade de esforço custa $ 10/0,45 = $ 22,2. O empregador seria indiferente entre esta situação e aquela em que o salário é de $ 20 com um esforço de 0,9 — o custo do esforço é exatamente o mesmo em todos os pontos da reta. Vamos chamá-la de reta isocusto de esforço. Semelhantes às retas isocusto do Capítulo 2, essas linhas unem pontos que têm efeitos idênticos sobre os custos do empregador. Também podemos vê-las como curvas de indiferença para o empregador.

As curvas de indiferença do empregador: curvas isocusto de esforço.
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Figura 6.5 As curvas de indiferença do empregador: curvas isocusto de esforço.

Reta isocusto de esforço
: Se w = US$ 10 e e = 0,45, então e/w = 0,045. Em todos os pontos dessa reta, a proporção entre esforço e salário é a mesma. O custo de uma unidade de esforço é w/e = US$ 22,22.
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Reta isocusto de esforço

Se w = US$ 10 e e = 0,45, então e/w = 0,045. Em todos os pontos dessa reta, a proporção entre esforço e salário é a mesma. O custo de uma unidade de esforço é w/e = US$ 22,22.

A inclinação da reta isocusto
: A reta se inclina para cima porque, para que a relação e/w permaneça inalterada, um nível mais alto de esforço deve ser acompanhado por um salário mais alto. A inclinação é igual a e/w = 0,045, a quantidade de unidades de esforço por dólar.
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A inclinação da reta isocusto

A reta se inclina para cima porque, para que a relação e/w permaneça inalterada, um nível mais alto de esforço deve ser acompanhado por um salário mais alto. A inclinação é igual a e/w = 0,045, a quantidade de unidades de esforço por dólar.

Outras retas isocusto
: Em uma reta isocusto, a inclinação é e/w, mas o custo do esforço é w/e. A reta mais inclinada tem menor custo de esforço, e a reta mais plana tem maior custo de esforço.
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Outras retas isocusto

Em uma reta isocusto, a inclinação é e/w, mas o custo do esforço é w/e. A reta mais inclinada tem menor custo de esforço, e a reta mais plana tem maior custo de esforço.

Algumas retas são melhores que outras para o empregador
: Uma reta mais inclinada significa menor custo de esforço e, portanto, maiores lucros para o empregador. Na reta isocusto de maior inclinação, ele recebe 0,7 unidades de esforço pagando um salário de $ 10 (em B), de modo que o custo do esforço é $ 10/0,7 = $ 14,29 por unidade. Na reta intermediaria, ele recebe apenas 0,45 unidades de esforço por este mesmo salário, de modo que o custo do esforço é de $ 22,22 e os lucros são menores.
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Algumas retas são melhores que outras para o empregador

Uma reta mais inclinada significa menor custo de esforço e, portanto, maiores lucros para o empregador. Na reta isocusto de maior inclinação, ele recebe 0,7 unidades de esforço pagando um salário de $ 10 (em B), de modo que o custo do esforço é $ 10/0,7 = $ 14,29 por unidade. Na reta intermediária, ele recebe apenas 0,45 unidades de esforço por este mesmo salário, de modo que o custo do esforço é de US$ 22,22, e os lucros são menores.

A inclinação é a TMS
: O empregador é indiferente entre os pontos de uma reta isocusto. Tal como outras curvas de indiferença, a inclinação da reta isocusto de esforço é a taxa marginal de substituição: a taxa pela qual o empregador está disposto a aumentar os salários para obter mais esforço.
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A inclinação é a TMS

O empregador é indiferente entre os pontos de uma reta isocusto. Tal como nas outras curvas de indiferença, a inclinação da reta isocusto de esforço é a taxa marginal de substituição: a taxa pela qual o empregador está disposto a aumentar os salários para obter mais esforço.

Para minimizar os custos, o empregador procurará atingir a reta isocusto de esforço com maior inclinação, na qual o custo de uma unidade de esforço é o mais baixo. Porém, como não pode impor o nível de esforço, ele tem que escolher algum ponto da curva de melhor resposta de Maria.

O melhor que o empregador pode fazer é fixar o salário em US$ 12 na reta isocusto que é tangente à curva de melhor resposta de Maria (ponto A). Utilize a análise da Figura 6.6 para ver como o empregador determina o salário.

O empregador estabelece o salário para minimizar o custo do esforço.
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Figura 6.6 O empregador estabelece o salário para minimizar o custo do esforço.

Minimizando o custo do esforço
: Para maximizar os lucros, o proprietário quer obter esforço pelo menor custo. Ele vai tentar chegar à reta isocusto mais inclinada possível. No entanto, como não pode definir o nível de esforço, ele tem que escolher um ponto da curva de melhor resposta do trabalhador.
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Minimizando o custo do esforço

Para maximizar os lucros, o proprietário quer obter esforço pelo menor custo. Ele vai tentar chegar à reta isocusto mais inclinada possível. No entanto, como não pode definir o nível de esforço, ele tem que escolher um ponto da curva de melhor resposta do trabalhador.

C não é o melhor que o empregador pode conseguir
: Este ponto poderia ser o C? Não. É evidente que, ao pagar mais, o proprietário irá se beneficiar de uma razão salário-esforço menor.
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C não é o melhor que o empregador pode conseguir

Este ponto poderia ser o C? Não. É evidente que, ao pagar mais, o proprietário irá se beneficiar de uma razão salário-esforço menor.

Ponto A é o melhor para o empregador
: Sua melhor opção é a reta isocusto que apenas toca (tangencia) a curva de melhor resposta do trabalhador.
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Ponto A é o melhor para o empregador

Sua melhor opção é a reta isocusto que apenas toca (tangencia) a curva de melhor resposta do trabalhador.

TMS = TMT
: Neste ponto, a taxa marginal de substituição (a inclinação da reta isocusto de esforço) é igual à taxa marginal de transformação de maiores salários em mais esforço (a inclinação da função de melhor resposta).
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TMS = TMT

Neste ponto, a taxa marginal de substituição (a inclinação da reta isocusto de esforço) é igual à taxa marginal de transformação de maiores salários em mais esforço (a inclinação da função de melhor resposta).

Ponto B
: Os pontos que estão em isocustos mais inclinados, como o ponto B, teriam custos menores para o empregador, mas não são factíveis.
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Ponto B

Os pontos que estão em isocustos mais inclinados, como o ponto B, teriam custos menores para o empregador, mas não são factíveis.

Custos mínimos factíveis
: Portanto, $ 12 é o salário-hora que o empregador deve estabelecer para minimizar custos e maximizar lucros.
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Custos mínimos factíveis

Portanto, $ 12 é o salário-hora que o empregador deve estabelecer para minimizar custos e maximizar lucros.

Na Figura 6.6, o empregador escolherá o ponto A, oferecendo um salário-hora de $ 12 para contratar Maria, que exercerá 0,5 de esforço. O empregador não tem alternativa melhor que este ponto: qualquer ponto com custos mais baixos não é factível, como, por exemplo, o ponto B.

O empregador minimiza custos e maximiza lucros no ponto em que sua TMS (a inclinação de sua curva de indiferença ou reta isocusto) é igual à TMT (a inclinação da curva de melhor resposta, que é sua fronteira de possibilidades). Ele equilibra o trade-off entre salário e esforço que está disposto a oferecer, com o trade-off que a resposta de Maria o obriga a enfrentar.

Leibniz: Encontrando o salário que maximiza os lucros

Este é um problema de escolha sob restrição, semelhante ao do Capítulo 3. Naquele caso, os indivíduos que maximizavam a utilidade escolhiam um número de horas de trabalho no qual TMS = TMT: a inclinação de sua curva de indiferença se igualava à inclinação da fronteira de possibilidades determinada pela tecnologia de produção.

salário de eficiência
Pagamento realizado pelo empregador, que supera o salário de reserva do empregado, de modo a motivá-lo a dedicar mais esforço ao trabalho do que geralmente escolheria realizar. Ver também: modelo de esforço de trabalho, renda do emprego.

Quando os salários são estabelecidos desta forma pelo empregador, são eventualmente chamados de salários de eficiência, porque o empregador está reconhecendo que o que importa para os lucros é e/w, as unidades de eficiência por dólar de custo salarial, ao invés do custo de uma hora de trabalho.

modelo de esforço de trabalho
Modelo que explica como os empregadores definem os salários de tal forma que os empregados recebam uma renda econômica (chamada de renda do emprego) que lhes forneça um incentivo para trabalhar com afinco, e assim evitem o fim do contrato de trabalho. Ver também: renda do emprego, salário de eficiência.

O que o modelo de esforço de trabalho nos mostrou?

  • Equilíbrio: no jogo proprietário-empregado, o empregador oferece um salário e, em resposta, Maria fornece um nível de esforço. Suas estratégias (e a alocação resultante) formam um equilíbrio de Nash.
  • Renda: nesta alocação, Maria se esforça porque recebe uma renda econômica por estar empregada que perderia caso descuidasse de seu trabalho.
  • Poder: como Maria tem medo de perder esta renda econômica, o empregador tem como exercer poder sobre ela, direcionando-a a agir de formas diferentes da que ela agiria se não houvesse este risco de perder o emprego, o que contribui para os lucros do empregador.

Desemprego involuntário

Quando pensamos sobre as implicações do modelo de esforço de trabalho para toda a economia, descobrimos algo que, a princípio, pode parecer surpreendente:

desemprego involuntário
Situação em que se está sem emprego, mas prefere-se ter um emprego com o salário e as condições de trabalho que outros trabalhadores empregados idênticos têm. Ver também: desemprego.

Sempre deve haver desemprego involuntário.

Estar desempregado involuntariamente significa não ter um emprego, mas estar disposto a trabalhar pelo salário que outros trabalhadores em uma situação semelhante estão recebendo.

Ao desenvolver nosso modelo, presumimos que Maria espera ficar desempregada durante 44 semanas, antes de receber outra oferta de salário no mesmo nível. Entretanto, o modelo implica que deve haver um período prolongado de desemprego.

Para ver o porquê, tente imaginar um equilíbrio do jogo entre Maria e seu empregador no qual ele lhe pagasse um salário-hora de $ 12, e caso ela perdesse o emprego, pudesse encontrar outro com o mesmo salário, imediatamente. Nesse caso, a renda do emprego de Maria seria zero. Ela seria indiferente entre manter seu emprego e perdê-lo. Sendo assim, sua melhor resposta seria um nível nulo de esforço. Mas esse não poderia ser um equilíbrio: o empregador não pagaria $ 12 por hora para alguém que não trabalhasse.

Se, em algum momento, ocorresse de haver muitos empregos disponíveis na economia com salário-hora de $ 12 sem que houvesse desemprego, essa situação não poderia durar muito tempo. Os empregadores ofereceriam salários maiores para garantir que os seus empregados teriam algo a perder e, portanto, um incentivo para se esforçar. Porém, com salários mais altos, não teriam como oferecer tantos empregos. Trabalhadores que perdessem seus empregos não conseguiriam encontrar outros facilmente. Haveria escassez de emprego e poderia levar semanas ou meses para encontrar outro. A economia teria chegado a um equilíbrio com salários mais altos e desemprego involuntário. Os empregados ganhariam $ 16 por hora, e aqueles que perderam seus empregos estariam dispostos a aceitar outro por $ 16, mas não conseguiriam encontrá-lo imediatamente.

Em equilíbrio, salário e desemprego involuntário devem ser altos o suficiente para garantir que haja suficiente renda do emprego para os trabalhadores se esforçarem em seu trabalho.

O desemprego é uma grande preocupação para os eleitores e para os formuladores de políticas públicas que os representam. Podemos usar este modelo para ver como as políticas que os governos executam com o objetivo de alterar o nível de desemprego ou de proporcionar renda para os trabalhadores desempregados afetarão os lucros das empresas e o nível de esforço de seus empregados.

Exercício 6.4 O empregador estabelece o salário.

Algum dos fatores a seguir seria capaz de afetar a curva de melhor resposta de Maria ou as retas isocusto de esforço da firma na Figura 6.6? Em caso afirmativo, explique de que forma.

  1. O governo decide aumentar os subsídios para o cuidado com os filhos de pais que estão empregados, mas não para aqueles que estão desempregados. Suponha que Maria tenha um filho e seja elegível para o subsídio.
  2. A demanda pelo produto da firma aumenta à medida que celebridades o divulgam.
  3. O progresso tecnológico torna o trabalho de Maria mais fácil.

Questão 6.7 Selecione a(s) resposta(s) correta (s)

A Figura 6.6 representa o salário de eficiência de equilíbrio de um trabalhador e de uma firma. De acordo com esta figura:

  • Ao longo da reta isocusto tangente à curva de melhor resposta, dobrar o esforço por hora de 0,45 para 0,90 levaria a um aumento do lucro da empresa.
  • A inclinação de cada reta isocusto é o número de unidades de esforço por dólar.
  • No ponto de equilíbrio, a taxa marginal de transformação na reta isocusto é igual à taxa marginal de substituição na curva de melhor resposta do trabalhador.
  • Os pontos C e A representam os equilíbrios de Nash porque estão na curva de melhor resposta.
  • Ao longo da reta isocusto, dobrar o esforço exige dobrar o salário. O custo do esforço não mudaria, de modo que o lucro também não se alteraria.
  • Retas isocusto têm uma razão de esforço sobre salário e/w constante. Desde que e esteja no eixo vertical e w esteja no eixo horizontal, a inclinação é e/w, que é o número de unidades de esforço por dólar pago.
  • No ponto de equilíbrio, a taxa marginal de substituição, entre um maior custo salarial e um maior nível de esforço na curva isocusto, é igual à taxa marginal de transformação de salários mais altos em mais esforço na curva de melhor resposta do trabalhador.
  • No ponto C, a escolha do nível de esforço do trabalhador é a melhor resposta se o empregador escolher aquele salário. Porém, neste caso, o empregador não estaria escolhendo sua melhor alternativa, dada a estratégia do trabalhador ao escolher o esforço. Portanto, essa situação não é um equilíbrio de Nash.

6.8 Colocando o modelo para funcionar: proprietários, empregados e a economia

Até agora, analisamos como o empregador escolhe um ponto na função de melhor resposta. Contudo, mudanças nas condições econômicas ou nas políticas públicas podem deslocar toda a função de melhor resposta, movendo-a para a direita (ou para cima) ou para a esquerda (ou para baixo).

O incentivo do empregado para escolher um alto nível de esforço depende de quanto ele tem a perder (a renda econômica do emprego), mas também da probabilidade de perdê-la. Portanto, a posição da função de melhor resposta depende:

  • da utilidade das coisas que podem ser compradas com o salário.
  • da desutilidade do esforço.
  • do salário de reserva.
  • da probabilidade de ser demitido a cada nível de esforço dedicado ao trabalho.

Se houver mudanças em algum desses fatores, a curva de melhor resposta se desloca.

Primeiro, imagine como um aumento da taxa de desemprego afeta a curva de melhor resposta. Quando o desemprego é alto, os trabalhadores que perdem seus empregos podem esperar passar por um período mais longo de desemprego. Lembre-se que a assistência aos desempregados, inclusive a ajuda da família e dos amigos, dura por tempo limitado, de modo que, quanto mais longo o período esperado de desemprego, menor o valor do auxílio-desemprego por hora de trabalho (ou por semana) perdido. Assim, um aumento no período de desemprego tem dois efeitos:

  • Reduz o salário de reserva: o que aumenta a renda do emprego por hora.
  • Estende o tempo de trabalho que se perde: o que aumenta as rendas totais do emprego (o custo de perder o emprego).

A Figura 6.7 exibe os efeitos de um aumento do desemprego, e também de um aumento no auxílio-desemprego, sobre a curva de melhor resposta.

A curva de melhor resposta depende do nível de desemprego e de auxílio-desemprego.
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Figura 6.7 A curva de melhor resposta depende do nível de desemprego e do nível de auxílio-desemprego.

O status quo
: A posição da curva de melhor resposta depende do salário de reserva, cruzando o eixo horizontal nesse ponto.
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O status quo

A posição da curva de melhor resposta depende do salário de reserva, cruzando o eixo horizontal nesse ponto.

O efeito do auxílio-desemprego
: Um aumento no seguro-desemprego eleva o salário de reserva e desloca a curva de melhor resposta do trabalhador para a direita.
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O efeito do auxílio-desemprego

Um aumento no auxílio-desemprego eleva o salário de reserva e desloca a curva de melhor resposta do trabalhador para a direita.

Aumento do desemprego
: Se o desemprego aumenta, a duração esperada do período de desemprego também aumenta. Assim, o salário de reserva do trabalhador cai e a curva de melhor resposta se desloca para a esquerda.
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Aumento do desemprego

Se o desemprego aumenta, a duração esperada do período de desemprego também aumenta. Assim, o salário de reserva do trabalhador diminui e a curva de melhor resposta se desloca para a esquerda.

Alterações no esforço a cada nível de salário
: Para um determinado salário-hora, digamos, $ 18, os trabalhadores fazem diferentes níveis de esforço quando os níveis de desemprego ou de auxílio-desemprego variam.
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Alterações no esforço a cada nível de salário

Para determinado salário-hora, digamos, $ 18, os trabalhadores fazem diferentes níveis de esforço quando os níveis de desemprego ou de auxílio-desemprego variam.

Um aumento no nível de desemprego desloca a curva de melhor resposta para a esquerda:

  • Para dado valor de salário-hora, digamos, $ 18, a quantidade de esforço que o trabalhador fará aumenta, melhorando as condições para obter lucro do empregador.
  • O salário que o empregador teria de pagar para obter determinado nível de esforço, digamos, 0,6, diminui.

Um aumento no auxílio-desemprego desloca a curva de melhor resposta para a direita, então esses fatores têm efeitos opostos.

As políticas econômicas podem alterar tanto o valor do auxílio-desemprego quanto o nível de desemprego em si (e, portanto, a duração do período de desemprego). Com frequência, essas políticas são objeto de controvérsia. Um deslocamento da função de melhor resposta do trabalhador para a direita favorece os trabalhadores, que farão menos esforço a qualquer nível de salário, enquanto um deslocamento para a esquerda favorece os proprietários, que adquirem o esforço dos seus trabalhadores a um custo mais baixo, o que aumenta os lucros.

Exercício 6.5 Esforço e salário

Suponha que, com a curva de melhor resposta do status quo representado na Figura 6.7, a firma determine o salário para minimizar o custo do esforço, e a melhor resposta do trabalhador seja um nível de esforço de 0,6. Se o desemprego aumentasse:

  1. O esforço seria superior ou inferior a 0,6 se a firma não alterasse o salário?
  2. De que forma a firma deveria alterar o salário se quisesse manter o nível de esforço em 0,6?
  3. Como o salário se alteraria se a firma minimizasse o custo do esforço ao novo nível de desemprego?

Como os economistas aprendem com os fatos Trabalhadores aceleram quando a economia desacelera

A ideia de que as rendas do emprego são um incentivo para que os empregados trabalhem com mais afinco é ilustrada em um estudo de Edward Lazear (conselheiro econômico do ex-presidente dos Estados Unidos, George W. Bush) e seus coautores. Eles analisaram uma única firma durante a crise financeira global para ver como administradores e funcionários reagiriam às turbulentas condições econômicas. A empresa era especializada em serviços de tecnologia — tais como processamento de pedidos de seguro, atribuição de notas de testes por computador, suporte técnico de telemarketing — e operava em 12 estados americanos. A natureza do serviço tornou mais fácil que a administração da firma rastreasse a produtividade dos trabalhadores, que é uma medida do esforço no trabalho.

Além disso, permitiu que Lazear e seus colegas utilizassem dados da empresa referentes ao período 2006−2010 para analisar o efeito da pior recessão desde a Grande Depressão sobre a produtividade dos trabalhadores.

Quando aumentou o desemprego, os trabalhadores passaram a prever que ficariam mais tempo desempregados caso perdessem o emprego. Diferentemente do que poderiam ter feito, as firmas não usaram seu maior poder de negociação para diminuir os salários, temendo a reação de seus empregados.

Lazear e seus coautores descobriram que, nessa empresa, a produtividade aumentou drasticamente à medida que o desemprego crescia durante a crise financeira. Uma possível explicação é que a produtividade média aumentou porque a administração despediu os membros menos produtivos da força de trabalho. No entanto, Lazear descobriu que o efeito se devia mais aos funcionários terem feito um esforço extra. A gravidade da recessão aumentou a renda do emprego dos trabalhadores para cada nível de salário dado e, portanto, eles estavam dispostos a trabalhar com mais afinco. Utilizando nosso modelo, teríamos previsto que a curva de melhor resposta teria se deslocado para a esquerda em virtude da recessão. Isto significava que (a menos que os empregadores diminuíssem substancialmente os salários) os trabalhadores trabalhariam com muito mais afinco. Aparentemente, foi o que aconteceu.16

Nosso modelo mostra que os empregadores poderiam ter cortado os salários mantendo a renda do emprego suficiente para motivar o esforço no trabalho. Uma recessão anterior deu outras pistas que ajudam a explicar a sua relutância em reduzir salários na crise. O economista Truman Bewley ficou perplexo quando viu apenas algumas poucas firmas do nordeste dos Estados Unidos cortarem salários durante a recessão do início dos anos 1990. A maioria das empresas, como aquela que a equipe de Lazear estudou, não cortou seus salários de forma alguma.

Bewley entrevistou mais de 300 empregadores, líderes trabalhistas, consultores de negócios e de carreiras no nordeste dos Estados Unidos. Ele descobriu que os empregadores optaram por não reduzir os salários porque achavam que isso prejudicaria o moral dos empregados, reduzindo a produtividade e levando a problemas de contratação e retenção. Lazear e sua equipe concluíram que cortes acabariam custando mais ao empregador do que o dinheiro poupado em salários.17

Exercício 6.6 Os resultados de Lazear

Utilize o diagrama de melhor resposta para esboçar os resultados encontrados por Lazear e coautores em seu estudo de uma firma durante a crise financeira global.

  1. Desenhe a curva de melhor resposta para cada um dos anos seguintes e explique o que esta curva ilustra:

    1. O período anterior à crise (2006).
    2. Os anos de crise (2007–2008).
    3. O ano posterior à crise (2009).

    Assuma que o empregador não tenha ajustado os salários.

  2. Há alguma razão para que uma firma não reduza salários durante uma recessão? Pense na pesquisa de Truman Bewley e nas evidências do experimento sobre reciprocidade do Capítulo 4.

Exercício 6.7 A terceirização chega em casa

No início deste capítulo, discutimos a decisão de muitas empresas do setor de vestuário de terceirizar a produção para Bangladesh e outras economias onde os salários são baixos. Represente seus resultados num único diagrama.

  1. Desenhe a curva de melhor resposta dos trabalhadores de um país onde os salários são altos, caso não ocorra terceirização (com salário no eixo horizontal e esforço no eixo vertical).
  2. No mesmo diagrama, represente a curva de melhor resposta dos trabalhadores de um país estrangeiro com salários baixos na ausência de terceirização (em ambos os casos, assuma que os salários são medidos em dólares).
  3. Represente no diagrama o que o empregador do país de origem pagará aos trabalhadores locais se a terceirização não for possível.
  4. Represente no diagrama o que o empregador do país de origem pagará aos trabalhadores dos países com salários baixos se a produção for deslocada para lá (ignore os custos de deslocamento da produção).
  5. Agora suponha que a terceirização é possível e é amplamente praticada por muitas firmas do setor de vestuário. Nessas condições, represente a função de melhor resposta dos trabalhadores do país de origem. Explique por que é diferente da sua resposta ao item 1. Ilustre esses resultados em um diagrama.

Questão 6.8 Selecione a(s) resposta(s) correta(s)

Qual(is) das seguintes afirmações está(ão) correta(s)?

  • Se o auxílio-desemprego aumentar, o menor custo possível de uma unidade de esforço para o empregador irá aumentar.
  • Se o salário não variar, os empregados trabalharão com mais afinco em períodos de alto desemprego.
  • Se os trabalhadores continuarem recebendo auxílio independentemente de quanto tempo estiverem desempregados, um aumento no nível de desemprego não terá efeito sobre a curva de melhor resposta.
  • Se a desutilidade do esforço de um empregado aumentar, o salário de reserva aumentará.
  • Um aumento no seguro-desemprego desloca a curva de melhor resposta para a direita. O empregador já não conseguirá alcançar a reta isocusto tangente à curva de melhor resposta original, então o custo do esforço deve aumentar.
  • Em períodos de alto desemprego, o custo de perder o emprego é maior. A qualquer dado nível de salário, os empregados escolherão fazer um esforço maior para reduzir a chance de perder seus empregos.
  • Nesse caso, um aumento do nível de desemprego não afetaria o salário de reserva, mas aumentaria o custo de perder o emprego, de modo que a curva de melhor resposta se alteraria.
  • Sob o salário de reserva, o empregado é indiferente entre emprego e desemprego, e não faria esforço algum. Logo, uma variação na desutilidade do esforço não teria efeito.

6.9 Outro tipo de organização empresarial

firma cooperativa
Firma cuja propriedade é parcial ou totalmente detida pelos seus trabalhadores, que contratam e demitem os administradores.

Mesmo em economias capitalistas, algumas organizações empresariais têm uma estrutura completamente diferente da que viemos analisando até aqui: nestas empresas, os trabalhadores são os proprietários dos bens de capital e de outros ativos da companhia, e são eles que selecionam os administradores que a dirigem no dia a dia. Essa forma de organização empresarial é chamada de cooperativa de propriedade dos trabalhadores ou firma cooperativa.18 19

Um exemplo bastante conhecido de cooperativa é a grande varejista britânica John Lewis Partnership, fundada em 1864 e de propriedade de seus empregados desde 1950. Todo empregado é sócio, e os conselhos de funcionários elegem cinco dos sete membros do conselho de administração da companhia. Os benefícios para os empregados (pensão, férias pagas, longos períodos sabáticos, atividades sociais) são generosos, e os lucros da empresa são distribuídos em forma de bônus, calculado como um percentual do salário de cada pessoa a cada ano. O bônus normalmente varia entre 10% e 20% do salário, mesmo depois de parte significativa dos lucros ser retida para investimento futuro. A John Lewis é uma das empresas varejistas mais lucrativas e mais consistentemente bem-sucedida da Grã-Bretanha.

Assim como as firmas convencionais, as cooperativas de trabalhadores são hierarquicamente organizadas, mas as diretrizes emitidas pelo topo da hierarquia vêm de pessoas que devem seu emprego aos trabalhadores proprietários da organização. Além disso, a principal diferença entre firmas convencionais e cooperativas de trabalhadores é que as cooperativas precisam de menos supervisores ou outros tipos de administradores para garantir que os trabalhadores-proprietários se esforcem e façam um bom trabalho. Os colegas de trabalho, que também são trabalhadores-proprietários, não vão tolerar um trabalhador que enrole para trabalhar porque enrolar reduz a participação nos lucros auferida pelos outros trabalhadores. A menor necessidade de supervisão dos funcionários está entre as razões pelas quais as cooperativas de trabalhadores produzem, por hora, pelo menos o mesmo (ou mais) que suas contrapartidas convencionais.

Além disso, nas cooperativas de trabalhadores, as desigualdades salariais internas (por exemplo, entre administradores e operários) são geralmente menores do que nas empresas convencionais. E as cooperativas tendem a não demitir funcionários quando a economia entra em recessão, oferecendo um tipo de seguro (com frequência, diminuem a carga horaria de todos os trabalhadores ao invés de demitir alguns) a seus trabalhadores-proprietários.

Os estudos de caso mostram que, nessas empresas peculiares cuja propriedade é majoritariamente dos próprios trabalhadores, o trabalho é feito com mais intensidade e menos supervisão. Houve muitas tentativas de estabelecer outros tipos de organização empresarial ao longo da história recente, mas obter empréstimos para iniciar e sustentar empresas de propriedade dos trabalhadores é frequentemente difícil: como veremos no Capítulo 10, os bancos muitas vezes relutam em emprestar recursos (exceto a altas taxas de juros) a pessoas que não são ricas.

O filósofo francês Charles Fourier (1772−1837) concebeu um mundo utópico no qual as pessoas viveriam em comunidades de 1.600 a 1.800 pessoas, chamadas de falanges. Fourier imaginava que os membros fariam toda a atividade industrial, artesanal e agrícola, e trabalhariam com afinco porque trabalhariam no que gostassem. Quem limparia vasos sanitários e banheiros, ou adubaria os jardins com estrume? Fourier sugeriu deixar esses serviços para as crianças, que adoram brincar com sujeira! Existiam dezenas de falanges em meados do século XIX, sendo mais de 40 só nos Estados Unidos.

Exercício 6.8 Uma cooperativa de propriedade dos trabalhadores

Na Figura 6.1, mostramos os atores e o processo de tomada de decisão de uma empresa convencional.

  1. Em que os atores e o processo de tomada de decisão da John Lewis Partnership são diferentes dos de uma empresa convencional?
  2. Redesenhe a Figura 6.1 para ilustrar sua resposta.

Grandes economistas John Stuart Mill

The Popular Science Monthly John Stuart Mill (1806−1873) foi um dos mais importantes filósofos e economistas do século XIX. Seu livro Sobre a Liberdade (1859) faz um paralelo com A Riqueza das Nações de Adam Smith em sua defesa de limites aos poderes governamentais, e ainda proporciona um influente argumento a favor da liberdade e da propriedade individuais.

Mill pensava que a estrutura da firma típica era uma afronta à liberdade e à autonomia individual. Em Princípios de Economia Política (1848), ele descreveu a relação entre os proprietários das empresas e os trabalhadores como antinatural: “Trabalhar em concorrência e para o lucro de outrem, sem qualquer interesse no trabalho… não é, mesmo quando os salários são altos, um estado satisfatório para seres humanos de inteligência educada,” escreveu Mill.20 21

Atribuindo a relação convencional empregador-empregado à precariedade da educação da classe trabalhadora, Mill previu que o acesso à educação e o empoderamento político dos trabalhadores alterariam esse quadro:

A relação entre mestres e operários será gradualmente substituída pela parceria… talvez, finalmente, por uma associação entre os próprios trabalhadores. (Princípios de Economia Política, 1848)

Exercise 6.9 Mill estava errado?

Na sua opinião, por que a visão de Mill sobre uma economia pós-capitalista de cooperativas de propriedade dos trabalhadores ainda não aconteceu?

6.10 Principais e agentes: interações sob contratos incompletos

Na relação entre Maria e seu empregador, o esforço de Maria no trabalho é importante para ambas as partes, mas não é coberto pelo contrato de trabalho: isto leva à existência de rendas do emprego. Se eles tivessem conseguido estabelecer um contrato completo, a situação teria sido bem diferente. O empregador poderia ter oferecido um contrato exigível a Maria, especificando tanto o salário quanto o nível exato de esforço que ela deveria fazer. Se esses termos fossem aceitáveis para ela, Maria teria concordado e trabalhado como exigido. Para maximizar seu lucro, o empregador teria escolhido um contrato apenas minimamente aceitável, de modo que Maria não ganharia renda alguma.

Esse exemplo não é incomum. Na prática, todas as relações de trabalho são regidas por contratos incompletos. Com frequência, contratos de trabalho nem mesmo têm o cuidado de mencionar que o trabalhador deve trabalhar bem e com afinco. E há muitas outras formas de interação social sem um contrato completo:

  • Pessoas e bancos emprestam dinheiro em troca de uma promessa de pagar o valor emprestado mais os juros estipulados. Contudo, isso pode ser inexigível se o devedor não puder quitar o empréstimo.
  • Os proprietários das firmas gostariam que os administradores maximizassem o valor dos seus ativos, mas os administradores têm seus próprios interesses (viagens aéreas de primeira classe, escritórios luxuosos), e os contratos com a administração muitas vezes não conseguem ser um recurso exigível para garantir a maximização da riqueza dos proprietários.
  • Os contratos assinados pelos locatários de apartamentos podem incluir cláusulas exigindo que eles conservem o valor da propriedade. Porém, exceto em casos de negligência grave, a responsabilização por ter conservado a propriedade é inexigível.
  • Os contratos de seguro exigem (mas geralmente não têm como garantir) que quem adquire os seguros se comporte de forma prudente e procure não correr riscos.
  • As famílias dedicam uma fração considerável de seus orçamentos a adquirir serviços de educação e saúde, cuja qualidade raramente é especificada num contrato (e se fosse, não seria exigível).
  • Os pais cuidam dos seus filhos na esperança — sem qualquer garantia contratual — de que eles retribuirão esse cuidado quando estiverem velhos e não puderem trabalhar.

Para essas e muitas outras trocas, parece que Emile Durkheim (1858−1917), o fundador da sociologia moderna, estava certo ao observar que “nem tudo no contrato é contratual”. Como nos exemplos acima, geralmente há algo importante para pelo menos uma das partes que não pode ser escrito em um contrato exigível.

Por que os contratos são incompletos?

Se pensarmos em alguns exemplos de interações econômicas, podemos ver que existem várias razões pelas quais não existem contratos completos:

  • A informação não pode ser verificada: para que um contrato seja exigível, as informações relevantes devem ser observáveis por ambas as partes, mas também verificáveis por terceiros, como os tribunais. O tribunal deve ser capaz de determinar se os requisitos do contrato foram ou não cumpridos. Informações verificáveis, com frequência, não estão disponíveis: por exemplo, pode ser impossível determinar se as más condições de um apartamento alugado se devem ao desgaste natural ou à negligência do inquilino.
  • Tempo e incerteza: um contrato geralmente é executado durante um período no qual especifica, por exemplo, que a Parte A faz X agora e a Parte B faz Y depois. Porém, o que B deve fazer depois pode depender de fatores desconhecidos quando o contrato foi escrito. É pouco provável que as pessoas possam prever tudo o que pode acontecer no futuro, e tentar fazê-lo provavelmente não seja eficiente em termos de custos.
  • Mensuração: muitos serviços e bens são inerentemente difíceis de medir ou de descrever com precisão suficiente para serem escritos em um contrato. Como o dono de um restaurante mediria o quão agradáveis seus empregados são ao interagirem com os clientes?
  • Ausência de aparato judicial: para algumas transações, não existem instituições judiciais (tribunais ou outras terceiras partes relevantes) capazes de exigir o cumprimento dos contratos. Muitas transações internacionais são desse tipo.
  • Preferências: mesmo nos casos em que a natureza dos bens ou serviços comercializados permita um contrato mais completo, um contrato não tão completo pode ser preferível. Vigilância intrusiva exercida por empregadores sobre os trabalhadores pode ter consequências indesejadas se a desconfiança do empregador irritar os trabalhadores, levando a um desempenho menos satisfatório em seu trabalho. Você considera ser imprescindível saber a qualidade exata de um concerto antes de comprar o ingresso: descobri-la pode ser parte da experiência.

Modelos principal-agente

relação principal-agente
Esse relacionamento existe quando uma parte (o principal) gostaria que a outra (o agente) agisse de certa forma ou tivesse algum atributo de interesse do principal cujo cumprimento não pode ser exigido ou garantido por um contrato vinculante. Ver também: contrato incompleto. Também conhecido como: problema principal-agente.

Muitas relações contratuais podem ser representadas da mesma forma: como um jogo entre dois jogadores, a quem chamamos de principal e agente, que enfrentam um conflito de interesses. Esses são conhecidos como problemas principal-agente. No caso de Maria e de seu empregador, o principal é o empregador. Ele gostaria de oferecer a Maria, o agente, um contrato de trabalho, e ela quer o emprego, mas a quantidade de esforço que fará não pode ser especificada no contrato porque não é verificável. Isso é um problema porque há um conflito de interesses: ele preferiria que ela trabalhasse com afinco, enquanto Maria prefere sossego.

Nosso modelo do emprego de Maria é um exemplo de uma classe geral de modelos principal-agente, na qual uma ação do agente está “escondida” do principal ou é ”não observável”.

  • O agente pode escolher alguma ação (como trabalhar com afinco),
  • o principal se beneficia dessa ação,
  • mas realizá-la não é algo que o agente escolheria fazer por vontade própria, talvez por ser oneroso ou desagradável (esse é o conflito de interesses) e,
  • como a informação sobre a ação não está disponível para o principal ou não é verificável,
  • não há como o principal utilizar um contrato exigível para garantir que a ação seja executada.
ações ocultas (problema das)
Ocorre quando alguma ação tomada por uma parte em uma troca não é conhecida ou não pode ser verificada pela outra. Por exemplo, o empregador não pode saber (ou não pode verificar) com quanto afinco o trabalhador que contratou está realmente trabalhando. Também conhecido como: risco moral. Ver também: atributos ocultos (problema dos).

Em resumo: um problema de ação oculta ocorre quando há um conflito de interesses entre principal e agente sobre alguma ação que o agente possa praticar e que não pode ser especificada em um contrato completo. Nestes problemas, a informação sobre a ação é assimétrica (o agente a conhece, mas o principal não) ou não é verificável (não pode ser usada por um tribunal para garantir o cumprimento do contrato).

A tabela da Figura 6.8 identifica os principais e os agentes nos exemplos desta seção.

Principal Agente Ação que está oculta, não coberta pelo contrato
Empregador Empregado Qualidade e quantidade de trabalho
Credor Devedor Reembolso do empréstimo, conduta prudente
Proprietário Administrador Maximização dos lucros dos proprietários
Locador Locatário Cuidados com o apartamento
Seguradora Segurado Conduta prudente
Pais Professor/médico Qualidade do ensino e do atendimento de saúde
Pais Filhos Cuidados na idade avançada

Figura 6.8 Problemas de ação oculta

Informação verificável, informação assimétrica

Uma informação é verificável se pode ser usada em um tribunal para garantir o cumprimento de um contrato. Informações não verificáveis, como os boatos, não podem ser utilizadas para executar contratos.

Informações que uma parte conhece, mas a outra não, são assimétricas.

Estudaremos o modelo principal-agente tipo credor-devedor no Capítulo 10. No Capítulo 12, introduzimos a segunda categoria relevante de modelos principal-agente, na qual não é a ação do agente que não pode ser incluída no contrato (ação oculta), mas uma característica do próprio agente que o principal desconhece (característica oculta).

Exercício 6.10 Relações principal-agente

Para cada exemplo a seguir, explique quem é o principal, quem é o agente e que aspectos de sua interação são do interesse de cada um e não são cobertos por um contrato completo.

  1. Uma empresa contrata um segurança para proteger suas instalações à noite.
  2. Uma organização sem fins lucrativos deseja solicitar uma pesquisa para descobrir o máximo possível sobre um novo vírus.

6.11 Conclusão

O produto do trabalho das pessoas pode ser transferido para os outros nos mercados, ou dentro das firmas, por meio de contratos de trabalho. Para entender o papel da firma, nós a analisamos não apenas como um ator, mas também como um palco no qual três conjuntos de atores (proprietários, administradores e empregados) interagem. Os modelos principal-agente nos ajudam a compreender como as firmas funcionam, ao nos permitirem identificar as consequências dos conflitos de interesses entre os atores quando esses não podem ser resolvidos por contratos completos.

Os contratos de trabalho são incompletos: podem especificar horas e algumas condições de trabalho, mas não o esforço do trabalhador, que não é verificável. Assim, os empregadores estabelecem salários mais altos que os salários de reserva dos trabalhadores, de modo que esses recebem uma renda do emprego que os motiva a trabalhar com afinco e os desencoraja a se demitirem. Quando todos os empregadores estabelecem os salários dessa forma, há desemprego involuntário na economia. Políticas públicas como a concessão de seguro-desemprego alteram os salários de reserva dos trabalhadores e suas curvas de melhor resposta e, assim, afetam todo o processo de determinação dos salários.

Conceitos introduzidos no Capítulo 6

Antes de seguir em frente, reveja estas definições:

6.12 Referências

  • Bewley, Truman F. 1999. Why Wages Don’t Fall during a Recession. Cambridge, MA: Harvard University Press.
  • Braverman, Harry, and Paul M. Sweezy. 1975. Labor and Monopoly Capital: The Degradation of Work in the Twentieth Century, 2nd ed. New York, NY: Monthly Review Press.
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  • Coase, Ronald H. 1992. ‘The Institutional Structure of Production’. American Economic Review 82 (4): pp. 713–19.
  • Couch, Kenneth A., and Dana W. Placzek. 2010. ‘Earnings Losses of Displaced Workers Revisited’. American Economic Review 100 (1): pp. 572–589.
  • Ehrenreich, Barbara. 2011. Nickel and Dimed: On (Not) Getting By in America. New York, NY: St. Martin’s Press.
  • Hansmann, Henry. 2000. The Ownership of Enterprise. Cambridge, MA: Belknap Press.
  • Helper, Susan, Morris Kleiner, and Yingchun Wang. 2010. ‘Analyzing Compensation Methods in Manufacturing: Piece Rates, Time Rates, or Gain-Sharing?’. NBER Working Papers No. 16540, National Bureau of Economic Research, Inc.
  • Jacobson, Louis, Robert J. Lalonde, and Daniel G. Sullivan. 1993. ‘Earnings Losses of Displaced Workers’. The American Economic Review 83 (4): pp. 685–709.
  • Kletzer, Lori G. 1998. ‘Job Displacement’. Journal of Economic Perspectives 12 (1): pp. 115–136.
  • Kroszner, Randall S., and Louis Putterman (editors). 2009. The Economic Nature of the Firm: A Reader, 3rd ed. Cambridge: Cambridge University Press.
  • Krueger, Alan B., and Alexandre Mas. 2004. ‘Strikes, Scabs, and Tread Separations: Labor Strife and the Production of Defective Bridgestone/Firestone Tires’. Journal of Political Economy 112 (2): pp. 253–289.
  • Lazear, Edward P., Kathryn L. Shaw, and Christopher Stanton. 2016. ‘Making Do with Less: Working Harder during Recessions’. Journal of Labor Economics 34 (S1 Part 2): pp. 333–360.
  • Marx, Karl. 1906. Capital: A Critique of Political Economy. New York, NY: Random House.
  • Marx, Karl. 2010. The Communist Manifesto. London: Arcturus Publishing.
  • Micklethwait, John, and Adrian Wooldridge. 2003. The Company: A Short History of a Revolutionary Idea. New York, NY: Modern Library.
  • Mill, John Stuart. 1994. Principles of Political Economy. New York: Oxford University Press.
  • Mill, John Stuart. 2002. On Liberty. Mineola, NY: Dover Publications.
  • O’Reilly, Tim, and Eric S. Raymond. 2001. The Cathedral & the Bazaar: Musings on Linux and Open Source by an Accidental Revolutionary. Sebastopol, CA: O’Reilly.
  • Pencavel, John. 2002. Worker Participation: Lessons from the Worker Co-ops of the Pacific Northwest. New York, NY: Russell Sage Foundation Publications.
  • Simon, Herbert A. 1951. ‘A Formal Theory of the Employment Relationship’. Econometrica 19 (3).
  • Simon, Herbert A. 1991. ‘Organizations and Markets’. Journal of Economic Perspectives 5 (2): pp. 25–44.
  • Toynbee, Polly. 2003. Hard Work: Life in Low-pay Britain. London: Bloomsbury Publishing.
  • Williamson, Oliver E. 1985. The Economic Institutions of Capitalism. New York, NY: Collier Macmillan.
  1. Herbert A. Simon. 1991. ‘Organizations and Markets’. Journal of Economic Perspectives 5 (2): pp. 25–44. 

  2. Herbert A. Simon. 1951. ‘A Formal Theory of the Employment Relationship’. Econometrica 19 (3). 

  3. Esses dois livros descrevem os direitos de propriedade, estruturas de autoridade e interações de mercado que caracterizam as firmas do capitalismo moderno.

    Henry Hansmann. 2000. The Ownership of Enterprise. Cambridge, MA: Belknap Press.

    Oliver E. Williamson. 1985. The Economic Institutions of Capitalism. New York, NY: Collier Macmillan. 

  4. Ronald H. Coase. 1937. ‘The Nature of the Firm’. Economica 4 (16): pp. 386–405. 

  5. Ronald H. Coase. 1992. ‘The Institutional Structure of Production’. American Economic Review 82 (4): pp. 713–19. 

  6. Karl Marx. (1848) 2010. The Communist Manifesto. Edited by Friedrich Engels. London: Arcturus Publishing. 

  7. Karl Marx. (1848) 2010. The Communist Manifesto. Edited by Friedrich Engels. London: Arcturus Publishing. Karl Marx. 1906. Capital: A Critique of Political Economy. New York, NY: Random House. 

  8. Susan Helper, Morris Kleiner, and Yingchun Wang. 2010. ‘Analyzing Compensation Methods in Manufacturing: Piece Rates, Time Rates, or Gain-Sharing?’ NBER Working Papers No. 16540, National Bureau of Economic Research, Inc. 

  9. Alan B. Krueger and Alexandre Mas. 2004. ‘Strikes, Scabs, and Tread Separations: Labor Strife and the Production of Defective Bridgestone/Firestone Tires’. Journal of Political Economy 112 (2): pp. 253–89. 

  10. Barbara Ehrenreich. 2011. Nickel and Dimed: On (Not) Getting By in America. New York, NY: St. Martin’s Press. 

  11. Polly Toynbee. 2003. Hard Work: Life in Low-pay Britain. London: Bloomsbury Publishing. 

  12. Harry Braverman and Paul M. Sweezy. 1975. Labor and Monopoly Capital: The Degradation of Work in the Twentieth Century. 2nd ed. New York, NY: Monthly Review Press. 

  13. Lori G. Kletzer. 1998. ‘Job Displacement’. Journal of Economic Perspectives 12 (1): pp. 115–36. 

  14. Kenneth A. Couch and Dana W. Placzek. 2010. ‘Earnings Losses of Displaced Workers Revisited’. American Economic Review 100 (1): pp. 572–89. 

  15. Louis Jacobson, Robert J. Lalonde, and Daniel G. Sullivan. 1993. ‘Earnings Losses of Displaced Workers’. The American Economic Review 83 (4): pp. 685–709. 

  16. Edward P. Lazear, Kathryn L. Shaw, and Christopher Stanton. 2016. ‘Making Do with Less: Working Harder during Recessions’. Journal of Labor Economics 34 (S1 Part 2): pp. 333–360. 

  17. Truman F. Bewley. 1999. Why Wages Don’t Fall during a Recession. Cambridge, MA: Harvard University Press. 

  18. No seculo XX, os produtores de compensados de propriedade dos trabalhadores competiram com sucesso com firmas capitalistas tradicionais nos Estados Unidos. John Pencavel. 2002. Worker Participation: Lessons from the Worker Co-ops of the Pacific Northwest. New York, NY: Russell Sage Foundation Publications. 

  19. A economia baseada no conhecimento está criando novas formas de empresas, nem capitalistas nem de propriedade do trabalhador. Tim O’Reilly and Eric S. Raymond. 2001. The Cathedral & the Bazaar: Musings on Linux and Open Source by an Accidental Revolutionary. Sebastopol, CA: O’Reilly. 

  20. John Stuart Mill. 2002. On Liberty. Mineola, NY: Dover Publications. 

  21. John Stuart Mill. 1994. Principles of Political Economy. New York: Oxford University Press.